Rituais e crenças diferentes na hora do adeus – Por Ana Maria Miranda*
A despedida a entes queridos é
sempre dolorosa.
Qualquer que seja a origem do morto e da família, todos
esperam se despedir da melhor forma possível de quem foi tão importante em suas
vidas.
A cerimônia do adeus, porém, não tem o mesmo significado para todos os
povos e religiões, que têm rituais e crenças diferentes.
Segundo o professor colaborador
do Departamento de Antropologia e Museologia da Universidade Federal de
Pernambuco (DAM/UFPE) Bartholomeu Figueirôa, o brasileiro criou uma cultura em
relação à morte:
"Roberto da Matta diz que a pessoa evita falar sobre a
morte, mas cuida muito dos mortos. Eles são como agregados à família dos
vivos". Conheça abaixo exemplos de despedida.
Candomblé
Uma das religiões de matrizes
africanas, o candomblé não vê a morte como o fim. De acordo com o babalorixá
Marcos de Ossain, "é apenas a continuidade de um ciclo". "A
pessoa deixa de ser a matéria, perde a matéria, para se tornar um
espírito", explica.
A crença da religião é de que, quando nasce, a pessoa
é acolhida no Aiê (terra) por um orixá: "É ele quem vai guiar a pessoa,
cuidar dela durante a vida, dar o caminho".
Quando a pessoa morre, é
realizado um ritual pós-morte, chamado Axexê: "Ele ocorre em etapas;
primeiro o corpo é preparado, em uma forma de liberar o espírito da
matéria".
Segundo Marcos de Ossain, a preparação é feita em uma casa de
pai de santo, é sagrada e só conhecida pelos que praticam a religião. Após o
desligamento, acontece o velório, no qual cânticos convidam os ancestrais para
que eles recebam o novo Egum (espírito), e todos os espíritos são
louvados.
Depois do velório, o Ará (corpo)
é sepultado. Após um ano da morte, é realizada a renovação da cerimônia, que
ainda é repetida com três anos e depois sete. Em caso de morte de pai ou mãe de
santo, a cerimônia de louvação dura sete dias após o sepultamento. Neste
período, as pessoas se privam de prazeres; não consomem bebida alcoólica nem
praticam relações sexuais.
Catolicismo
Para a igreja católica, o Dia de
Finados tem o significado de lembrar a memória das pessoas que faleceram. Neste
dia, os fiéis visitam os cemitérios e realizam celebrações. De acordo com o
padre Jacques Trudel, a igreja "reza para que Deus possa acolhê-los na
misericórdia". o enterro é normalmente realizado nas 24h que sucedem a
morte.
No velório e enterro, que
costumam ser no mesmo momento, é celebrada uma missa de corpo presente, com a
presença de velas, incenso, água benta e flores.
"A incensação é um sinal
de veneração, a água serve para lembrar do batismo, a vela representa a vida
que vai se queimando, a luz é um sinal de Deus, e o crucifixo é para recordar
que Cristo morreu por todos nós e é a luz da ressurreição", explica.
Outro símbolo da fé na igreja é o
luto. Segundo o padre, antigamente as pessoas costumavam vestir roupas de cores
simbólicas (normalmente preto) para demonstrar que tinham perdido um amigo ou
familiar.
"É importante para as pessoas que ficam viver o luto e
permitir-se o luto, é um momento de partida e de entender que precisamos deixar
o outro morrer para viver", explica.
Indígenas
O ritual de despedida dos mortos
entre os indígenas varia de acordo com a etnia ou tribo. Na aldeia Pancararu,
em Tacaratu, município do Sertão de Pernambuco, distante 450 quilômetros do
Recife, o ritual de sepultamento tem a participação de entidades espirituais
chamadas de encantados (os praiás). Cobertos da cabeça aos pés, eles saem das
matas tocando gaitas e balançando chocalhos. Fazem uma reverência na porta da
casa onde o morto está sendo velado, antes de entrar. Dentro da casa, cantam e
dançam em volta dos caixões. O praiás acompanham todo o cortejo fúnebre.
Judaísmo
Para os judeus, a morte é uma
passagem que representa uma herança que a pessoa deixou para a comunidade e sua
família.
"A vida, para os judeus, tem um sentido muito forte", diz a
diretora científica e curadora do Arquivo Histórico Judaico de Pernambuco,
Tânia Kaufman. Segundo ela, não existe céu nem inferno para a cultura do
judaísmo.
Para o enterro de um ente judeu,
o corpo é preparado e lavado por pessoas especializadas da comunidade, para que
ele volte a ser como era quando nasceu, purificado.
"A pessoa é vestida
com uma túnica branca, independente se é rica ou pobre, e é realizado um
velório. Fecha-se a tampa do caixão e ela é sepultada no cemitério judaico",
explica Tânia. Antes do funeral, os membros da família do morto rasgam um
pedaço de suas próprias roupas, como símbolo do luto.
A simplicidade do enterro judeu
deve-se ao conhecimento pela religião de que "a morte é democrática".
No Recife, existem dois cemitérios judaicos: o Cemitério Israelita do Barro e
um espaço no cemitério Parque das Flores, ambos localizados na Zona Oeste da
capital pernambucana.
Maçonaria
Apesar de não ser uma religião, a
maçonaria, sociedade secreta de homens, tem rituais próprios que são
compartilhados entre as pessoas da ordem.
"O sepultamento do irmão é feito
de acordo com o desejo da família. Quando os irmãos participam, eles vão ao
cemitério vestidos com o avental de maçônico, que varia conforme a ordem e o
grau e cada um deposita um ramo de acácia, que representa a
imortalidade", informou a assessoria de imprensa do gabinete do Grão
Mestre Daury Ximenes, do Grande Oriente de Pernambuco. O grupo também costuma
rodear o caixão do irmão enquanto pede para que ele seja bem recebido na outra
vida.
As pessoas que ingressam na
maçonaria podem possuir crenças diferentes desde que acreditem em um
"supremo arquiteto do universo", que pode ser Deus, Alá, entre
outros. Com o mínimo de sete dias após a morte, é realizada a cerimônia das
"pompas fúnebres", que é uma reunião feita na loja maçônica,
especialmente para homenageá-lo. Essa cerimônia é aberta ao público e com a
presença de familiares do morto.
Protestantismo
Cerimônias fúnebres de
protestantes se assemelham às católicas, em que o enterro é acompanhado por uma
celebração religiosa (culto). Para eles, o céu e inferno existem, e o
julgamento final acontece pela fé que o morto teve na palavra de Deus e pelo
amor ao Senhor. Não se utilizam velas, apenas flores, nem há uso de crucifixo.
*Colaborou a repórter Cleide
Alves, da editoria de Cidades do Jornal do Commercio
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