Frente à globalização, Teologia da Libertação está mais necessária do que nunca, diz teólogo – Por Marcela Belchior
"Para a Teologia da
Libertação, não interessa tanto a existência de Deus, se Deus existe ou não.
Interessa saber onde está Deus, quer dizer, na luta da libertação dos povos.
(...) Agora, esse tipo de teologia é mais necessária do que nunca, frente à
globalização do capital”.
Com essa assertiva, um dos mais expoentes teólogos da
Libertação, o belga François Houtart, situa de que maneira essa orientação
libertadora do cristianismo fortalece diálogo com as demandas das populações
oprimidas em todo o globo e como religião e doutrina social podem caminhar
articuladas.
Ele participou, recentemente, do
Programa Escuela Cuadros, projeto formativo para estudo e desenvolvimento do
marxismo, transmitido pela televisão e pela internet, com sede em Caracas,
capital da Venezuela.
Durante a entrevista, Houtart utiliza os estudos em torno
da figura de Cristo para demonstrar como a Teologia da Libertação, emergida da
luta dos povos nos anos 1960, está cada vez mais atual e em diálogo com as
demandas sociais.
"A prática e o discurso de
Jesus foi bastante claro. Se opôs, por exemplo, ao templo. Mas o templo não era
uma igreja ou uma basílica ou uma catedral; o templo era o centro do poder.
(...) Frente a uma população muito empobrecida”, expõe.
"Assim, a crítica ao templo
por Jesus não somente era de tipo religioso, mas de tipo completo, ou seja, a
crítica de todos os poderes sociais, econômicos, políticos e religiosos da
sociedade. (...) Sua mensagem era muito mais universal e mais fundamental. Por
isso tem um lugar que segue na história, porque é um lugar de crítica de todos
os poderes que oprimem as pessoas, qualquer que seja”, explica o teólogo.
O reforço aos preceitos e
práticas da Teologia da Libertação se contextualiza num período em que
católicos do mundo todo assistem à necessidade de reformas dentro da Igreja
Católica.
A mensagem libertadora tem refletido as lutas de superação da
opressão também na figura do Papa Francisco, eleito em 2013, e que tem proposto
o diálogo e uma maior abertura da instituição para as demandas sociais,
políticas, ecológicas, econômicas, dentre outras, do século XXI.
"A doutrina social clássica
da Igreja condena o capitalismo, os últimos papas todos têm condenado o
capitalismo, mas em função de seus abusos e de suas consequências negativas.
(...) A Teologia da Libertação utiliza outro instrumento: o instrumento
marxista, em particular, que mostra as estruturas sociais, classes sociais e
que há contradições de classe”, aponta o professor.
Para Houtart, não há
possibilidade de um novo capitalismo, aquele dito "verde” ou
"social”. "É o capitalismo em sua lógica que devemos condenar”,
afirma. Esta, indica o teólogo, é uma das diferenças entre a doutrina social da
Igreja clássica e a Teologia da Libertação.
"A Teologia da Libertação é
uma outra maneira de ler a Bíblia, com um sentido mais crítico, mais histórico,
que permite atualizar a mensagem da Bíblia para o tempo atual”, defende.
"Também é uma teologia da Igreja, ou seja, o que é o sentido da Igreja
como instituição, também com uma visão crítica, sabendo que, às vezes, a Igreja
está muito vinculada aos poderes”, acrescenta o teólogo.
Houtart é um sacerdote católico e
sociólogo marxista. Professor emérito da Universidade Católica de Lovaine
(UCL), na Bélgica, e do Instituto de Altos Estudos Nacionais (IAEN) de Quito,
capital do Equador. É autor de mais de 50 livros e centenas de artigos
especializados, entre eles "A transformação social na América Latina”
(1964) e "Deslegitimando o capitalismo; reconstruindo a esperança” (2005).
Fonte: http://site.adital.com.br
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