Poder do eleitorado evangélico impede debate sobre temas polêmicos - Por Karina Gomes
Peso do voto religioso freia
discussão sobre temas como aborto, direitos dos homossexuais e legalização da
maconha. Especialista vê Dilma como a candidata mais bem relacionada com esse
público.
O debate de temas polêmicos, como
aborto e legalização da maconha, deve ficar abafado nas campanhas dos três
principais candidatos à Presidência da República até a realização do primeiro
turno das eleições.
Com essa estratégia, a presidente Dilma Rousseff e os
oposicionistas Aécio Neves e Eduardo Campos buscam não desagradar os
evangélicos, que representam 22,2% da população brasileira, segundo o IBGE.
Para especialistas, o peso do
voto religioso freia uma discussão mais ampla sobre temas ligados, por exemplo,
aos direitos das mulheres, direitos dos homossexuais e ao combate ao tráfico de
drogas. O comentarista político Kennedy Alencar avalia que compromissos
políticos estabelecidos durante a campanha vão comprometer as decisões do
próximo presidente.
"São assuntos que pertencem basicamente ao Congresso.
Se são levados à disputa presidencial, os candidatos ficam de mãos atadas se
quiserem lidar com a questão do aborto, por exemplo, do ponto de vista da saúde
pública", argumenta. "Dessa maneira se congelam temas que merecem
debate, respeitadas todas as posições."
Marcos Pereira, presidente do
Partido Republicano Brasileiro (PRB), legenda ligada à Igreja Universal,
defende que os posicionamentos sobre questões do campo moral sejam claros entre
os candidatos.
"Se tiverem que se posicionar, devem fazer isso abertamente
para não deixar dúvidas sobre o que pensam. O eleitorado evangélico acaba
tomando a resposta duvidosa como algo contrário ao que ele pensa", disse o
bispo, ressaltando que, no primeiro mandato, Dilma não fomentou nem apoiou a
discussão de temas polêmicos.
Dilma tem melhor interlocução
Segundo o historiador Marco
Antônio Villa, a relação dos candidatos à Presidência com lideranças
evangélicas é instrumental: o elo criado entre religião e política busca
favorecimentos mútuos.
"Desde as eleições de 2002, virou tradição procurar
líderes de igrejas. Os candidatos acreditam que esses representantes têm grande
influência sobre os adeptos. Os líderes das igrejas, por sua vez, buscam obter
uma série de proveitos políticos e financeiros", explica.
Com o início da propaganda
eleitoral gratuita no dia 19 de agosto, a disputa pelo eleitor evangélico vai
se intensificar, e deve ficar polarizada entre a presidente Dilma Rousseff, do
PT, e o candidato pelo PSDB, Aécio Neves.
Segundo recente pesquisa do Ibope, a
petista lidera a disputa com 38% das intenções de voto, seguida de Aécio, com
23%, e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, candidato pelo PSB, com 9%.
O tucano conta com o apoio do
pastor e presidente da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil, José
Wellington Bezerra da Costa. A coordenação da campanha de Aécio, no entanto,
diz que não há um planejamento específico para o eleitorado evangélico.
Temas polêmicos devem ser mais
explorados no segundo turno, especialmente se a disputa for entre Dilma e
Aécio. "Ele vai tentar colocar Dilma contra a parede. E vai usar muitos
dos documentos produzidos pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência
para confrontá-la em relação às demandas dos religiosos", prevê Villa.
Para o historiador, a presidente
é a candidata que tem a melhor interlocução com o setor. Assim como em 2010,
Dilma vai contar com amplo apoio da Igreja Universal do Reino de Deus.
"Ela está no governo, que tem instrumentos poderosíssimos de controle. As
concessões de rádio e televisão, por exemplo, interessam muito aos
evangélicos", afirma.
Campos será apoiado pelo pastor
Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Marina Silva,
candidata a vice-presidente pela legenda, é evangélica, mas, segundo a
coordenação da campanha, não deve atuar perante esse eleitorado. Na semana
passada, porém, Marina levou o candidato a um encontro com 2 mil pastores na
Assembleia de Deus de São Paulo.
Evangélico vota em evangélico?
A novidade da eleição
presidencial deste ano é um candidato pastor. Quarto colocado nas pesquisas,
Everaldo Pereira, vice-presidente nacional do Partido Social Cristão (PSC) e
líder da Assembleia de Deus, está com 3% das intenções de voto, de acordo com o
Ibope.
Villa considera que, para uma
"pessoa desconhecida", o índice é significativo. "A aprovação
dele é grande no Rio de Janeiro, o segundo maior colégio eleitoral do país. Se
permanecer nessa faixa, será extremamente importante para a realização de um
segundo turno", analisa.
A bancada evangélica no Congresso
conta com 73 parlamentares. E a intenção da Frente Parlamentar Evangélica da
Câmara dos Deputados é aumentar esse número em pelo menos 30% nessas eleições.
Especialistas não acreditam, no
entanto, que, na hora de votar, os fiéis sigam necessariamente as indicações
políticas dadas pelas lideranças religiosas.
"Acho que há uma avaliação
exagerada desse apoio. É natural que os pastores afirmem ter enorme influência,
afinal, querem que seu apoio político seja recompensado. Acredito que esse
eleitorado tenha uma relativa independência", diz Villa.
"A
representatividade dos evangélicos nas assembleias legislativas e na Câmara é
muito menor do que o número de fiéis existentes no país."
Apesar de os políticos estarem
dispostos a instrumentalizar o voto religioso a qualquer preço, ele não deve
decidir essas eleições, afirma o historiador de religiões Leandro Seawright
Alonso.
"Existe uma tendência de os
fiéis seguirem seus pastores em alguns setores. A escuta dos pastores
pentecostais na periferia, por exemplo, é mais ampliada", diz. "Os
políticos assediam as igrejas, mas ainda não há um voto evangélico em nível
nacional que seja decisivo para as eleições presidenciais."
Fonte: http://www.dw.de
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