Sionismo religioso: o fundamentalismo contra a paz - Por Leneide Duarte-Plon


Eles esperam o Messias, cantam e dançam a cada novo metro de terra conquistada à força, são obcecados pelo problema demográfico, defendem a anexação pura e simples da Cisjordânia (que chamam de Judeia-Samaria) e se opõem a todos os que dizem buscar soluções políticas de paz, sejam políticos, sejam diplomatas. 

Seus líderes religiosos instigaram seguidores a pedir a morte de Itzak Rabin, que negociara com Shimon Peres e Arafat os Acordos de Oslo, em 1993. Logo apareceu um voluntário para executar o primeiro-ministro, visto como "traidor".

Eles são os fanáticos do sionismo religioso que seguem rabinos extremistas como HaCohen Kook e seu filho Yéhuda. São cada vez mais numerosos e pregam a iminente chegada do Messias e a necessidade de construir o templo no lugar da atual Mesquita Al-Acqsa, o terceiro lugar mais sagrado do Islã, cuja cúpula dourada pode ser vista de quase toda Jerusalém, cidade santa dos três monoteísmos. O local onde fica Al-Acqsa é conhecido pelos árabes como a Esplanada das Mesquitas e pelos sionistas como o Monte do Templo.

Alguns dos sionistas religiosos falam abertamente do plano de explosão da mesquita de 1300 anos, para dar lugar ao templo que, segundo a tradição judaica ortodoxa, ocupava aquele espaço. Arquitetos já têm o projeto pronto.

O jornalista e escritor Charles Enderlin, um dos maiores conhecedores do conflito Israel-Palestina, que cobre há longos anos, é o autor do extraordinário documentário: "Au nom du Temple” (Em nome do templo), realizado em parceria com Dan Setton.

O filme, que mostra a ascensão do sionismo religioso e seu combate contra todas as iniciativas de paz, foi feito há um ano e exibido pelo canal France2 apenas na terça-feira, 31 de março. Ficou engavetado no canal público e depois de muitas hesitações pôde finalmente ser exibido. Mas um pouco antes de meia noite, para evitar o grande público do horário nobre pois o filme incomoda os que preferem denunciar o fundamentalismo islâmico.

Os documentaristas recolheram testemunhos de sionistas religiosos e de seus críticos para contar como o Estado de Israel viu a direita "annexioniste" (um neologismo que funde as palavras sionista e anexação) se expandir até representar mais da metade dos eleitores e garantir a perenidade da política de colonização representada por governantes como Benjamin Netaniahu. O documentário rememora os últimos 20 anos da política israelense para mostrar como o país mergulhou numa espécie de messianismo fundamentalista.

Para o historiador Zeev Sternhell, "a esquerda não quis ver por covardia essa corrente ideológica e política enorme, poderosa, uma verdadeira torrente". Se os fundamentalistas resolverem atacar a mesquita de Jerusalém isso será visto como uma declaração de guerra ao Islã em geral, adverte Sternhell.

Pesquisas feitas em Israel mostram que 51% das pessoas acreditam que o Messias vai chegar e 67% pensam que o povo judeu é o povo eleito de Deus. Todos os indicadores revelam que o sionismo messiânico ganha terreno no país. O documentário mostra um grupo de fundamentalistas matando um cordeiro para sacrificá-lo num altar a céu aberto, ritual que os judeus cumpriram desde o tempo de Abraão e mantiveram até dois mil anos atrás, ainda na época de Cristo.

O professor Matti Steinberg, ex-analista principal do Shin Beth (serviço de segurança interna israelense) afirma que o conflito pode transformar-se em guerra de religião. Ele argumenta que sunitas e xiitas se unirão para atacar o agressor do terceiro lugar mais sagrado da religião muçulmana. Ninguém sabe o que pode resultar desse ataque.

Ao falar dos 400 mil colonos israelenses que já ocupam 60% da Cisjordânia, o geógrafo palestino Khalil Toufakji diz, comparando um mapa de alguns anos atrás com o atual: "a solução do conflito com dois Estados não é mais viável".

O filme mostra que as iniciativas diplomáticas se chocam com a realidade de colonos nacionalistas determinadas a ocupar a Cisjordânia e impedir qualquer possibilidade de criação do Estado da Palestina. Os diferentes governos de direita fazem um jogo duplo se equilibrando entre o direito internacional e os colonos.

Os nacionalistas consideram Baruch Goldstein um herói pelo fato de ter matado 29 palestinos que rezavam numa mesquita em Hebron, em 1994. Na visão dos fanáticos, os palestinos, apresentados como "colonos árabes", é que são os ocupantes.

Reportagem feita pela televisão francesa mostrou há poucas semanas um grupo de militantes do Estado Islâmico, armados até os dentes. Um deles gritava que estavam lutando para em breve libertar Jerusalém dos sionistas.

Quando o combate político cede lugar aos dogmas religiosos, os fanáticos tomam o lugar dos diplomatas. No que resultará o encontro dos dois fundamentalismos?






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