Midiatização do Papa é sinal de crise da Igreja Católica – Por Dario Citati
Durante o auge da popularidade do
primeiro Sumo Pontífice sul-americano, muitos dos fiéis da Igreja romana vivem
uma doença dissimulada por uma estratégia que pode mudar a forma e o conteúdo
da sua fé.
À primeira vista, a grande
popularidade do Papa Francisco na opinião pública internacional confirma um dos
princípios essenciais do Catolicismo, cuja estrutura eclesiástica é baseada na
primazia jurídica do Papa sobre os outros bispos.
Na realidade, acontece o
oposto: depois da sua eleição à sé romana, Jorge Mario Bergoglio ganhou muita
popularidade não graças à sua ação doutrinária e à sua autoridade papal, mas
devido à midiatização da sua personalidade e à imagem que ele cria de si
próprio, de um Papa diferente dos seus antecessores.
Portanto, a veneração da
personalidade de Francisco esconde um afrouxamento do instituto papal. Hoje em
dia, a vontade de reforçar a imagem do Catolicismo entre os não católicos
parece prevalecer sobre os assuntos internos e sobre os princípios morais.
Contudo, a sorte do Catolicismo na história mundial dependerá desses assuntos e
desses princípios.
No plano doutrinário, a
“revolução” de Francisco é bastante significativa. Trata-se, primeiro, de uma
mudança de modos e de conduta exterior: na mímica, nos gestos, na sua linguagem
simples e elementar. Tudo isso parece contribuir para uma dessacralização da
função papal, que atrai bastante os adversários do Cristianismo, criando a
imagem não de um Papa autoritário, mas de um avô simpático e legal.
Segundo,
observa-se uma alteração na escala de prioridades nas intervenções públicas do
pontífice.
O Papa Francisco insiste com
frequência em temas que não se referem especificamente à fé, à moral. Muitas
vezes ele faz discursos comentando a imigração, criticando o capitalismo,
apelando ao respeito ao meio ambiente.
No entanto, as questões propriamente
religiosas restam na periferia e são sujeitas a uma mensagem de concordância
civil e humanitária.
Bergoglio nunca questionou nenhum dogma e nenhum princípio
do Catolicismo, a sua “revolução” consiste em pronunciar discursos ambíguos ou
em tolerar práticas heterodoxas sem manifestar-lhes o seu apoio abertamente.
A sua estratégia comunicativa
descreve-se com a célebre frase: “Quem sou eu para julgar?”, usada pelos
progressistas para justificar a aprovação de toda a transgressão.
Dir-se-ia que
ele prefere ficar ambíguo, desta maneira abandonando o estilo dos Papas
anteriores e a exigência de Cristo de transmitir a doutrina claramente: “Seja,
porém, o vosso falar: Sim, sim; Não, não; porque o que passa disto é de
procedência maligna” (Mt, 5:37).
Os apelos para uma Igreja “pobre
para os pobres” revelam bastante também. Nada podia ser mais midiático, visto
que os abusos dos sacerdotes são muito chocantes para a opinião pública. É
louvável condenar as riquezas pessoais dos sacerdotes, mas se a Igreja como
instituição fosse “pobre” ela própria, ou seja, sem recursos, como ela poderia
ajudar a combater a pobreza?
A midiatização da pessoa do Papa
Francisco tem também o efeito de esconder os problemas interiores do
Catolicismo, que são enormes. Na Igreja Católica existe hoje uma fragmentação
quase incrível, há pequenos grupos cujas posições são incompatíveis entre si e
até contrastam com a fé católica tradicional. Certos especialistas já falam da
existência de igrejas distintas no interior da Igreja Católica.
Claro que há também elementos
positivos que caracterizaram o primeiro ano do governo de Francisco. A Santa Sé
tornou-se mais influente no estrangeiro graças ao Papa argentino. A sua posição
contra a ameaça estadunidense de guerra à Síria, a sua sábia e equilibrada
conduta em relação à Ucrânia, a carta que ele enviou em 2013 ao presidente
russo, Vladimir Putin, todas estas decisões foram guiadas pelo bom senso.
O melhor resultado do trabalho
diplomático do Vaticano durante o governo de Francisco é, sem dúvida, a
“desocidentalização” do Catolicismo. Este movimento pode ser avaliado como
positivo, porque ele viabiliza a possibilidade de um posicionamento geopolítico
adequado aos problemas futuros.
No entanto, há questões que
permanecem abertas. A Igreja Católica não é a pessoa de Jorge Mario Bergoglio,
cuja existência terminará um dia, como a de todo ser humano. A sua popularidade
sozinha não revitalizará a religião católica.
O Papa Francisco, na sua primeira
homilia em 2013, afirmou que a Igreja não pode transformar-se em uma ONG: “filantrópica e de caridade”, o que às vezes parece ser o seu destino.
O Catolicismo
poderá, ao contrário, sobreviver na medida de que ele seja capaz de oferecer
uma perspectiva alternativa aos modelos dominantes, de explicar o destino
metafísico do ser humano em um mundo que pôs de lado Deus.
Fonte: http://portuguese.ruvr.ru
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