Líder islâmico recusa ideia de "religião de fanáticos" – Por Abdool Vakil
De raridade nos anos 1950, o
islão passou a ser visto como "religião de fanáticos" após os ataques
terroristas de 11 de setembro de 2001, estereótipo que o líder da Comunidade
Islâmica portuguesa atribui ao desconhecimento religioso.
"Em 1956, quando vim para
cá, era uma raridade. As pessoas estranhavam e faziam-me perguntas curiosas
porque jejuava, não comia carne de porco nem bebia vinho. O islão era uma coisa
nova", recordou à agência Lusa Abdool Vakil, fundador e líder há mais de
25 anos da Comunidade Islâmica de Lisboa.
Em 1974, os muçulmanos em
Portugal continuavam a não ultrapassar as duas dezenas. A comunidade islâmica
de Lisboa tinha já sido registada no notário, mas não tinha reconhecimento como
organização religiosa.
As festas religiosas eram feitas
inicialmente na casa da família de Abdool Vakil, posteriormente na cave da
residência oficial do embaixador do Egito e mais tarde num espaço cedido pelo
Governo próximo da zona do Príncipe Real, em Lisboa.
A mesquita central de Lisboa foi
inaugurada em 1984. Por essa altura, a comunidade era já estimada em mais de
quatro mil pessoas (Censos de 1981), engrossada sobretudo por gente proveniente
das antigas colónias portuguesas.
A comunidade está hoje estimada
em 55 mil pessoas, segundo Vakil. No Censos de 2011, foram cerca de 20.600 os
que se identificaram como muçulmanos. As mesquitas e os locais de culto
são mais de meia centena em todo o país e estão localizados em ginásios,
edifícios de habitação, garagens ou apartamentos.
Metade da comunidade é composta
por africanos, na maioria da Guiné-Bissau, a que se seguem os oriundos da
Somália, Sudão e Costa do Marfim. A outra metade é composta por
gente de origem indiana, egípcios, sauditas, iraquianos, marroquinos e
argelinos.
Num país de maioria católica,
Abdool Vakil afirma nunca se ter sentido vítima de "islamofobia",
mesmo depois dos atentados terroristas reivindicados pela Al-Qaida ao World
Trade Center de Nova Iorque, a 11 de setembro de 2001.
Para Abdool Vakil, é o
desconhecimento que faz com que ainda hoje muitas pessoas pensem "que o
islão é uma religião de fanáticos, de intolerantes", que não aceita
nenhuma outra religião.
"As religiões são todas
válidas, não devemos discriminar. Cada um tem a sua e Deus é que vai julgar
quem tem a verdadeira religião", considerou Abdool Vakil, citando uma
passagem do livro sagrado dos muçulmanos, o Corão: "Tu praticas a tua
religião e eu pratico a minha". "Nesta sociedade, as pessoas
não podem pensar de forma fanática sobre a religião, tem que haver o tal 'live
and let live'[vive e deixa viver]".
Para isso, defendeu Abdool Vakil,
é preciso "ter noção do que são as outras religiões" e, nesse
sentido, considerou que seria muito importante que nas escolas houvesse uma
disciplina sobre religiões.
"Não é para converter
ninguém, mas é para as pessoas saberem o que são as outras religiões",
disse, explicando que não tem sido possível conseguir juntar os 10 alunos por
escola exigidos por lei para que a religião muçulmana seja ensinada nas escolas
públicas.
Uma falha que tem procurado
compensar com a escola muçulmana (madrassa) que existe na Mesquita de Lisboa,
onde se ensina língua e cultura árabe e religião, aulas que têm suscitado
interesse e resultado "num número significativo de conversões".
Sobre o caminho feito por
Portugal em matéria de liberdade religiosa em 40 anos de democracia, Abdool
Vakil destacou a aprovação da lei de liberdade religiosa (2001) e as boas
relações existentes com a Igreja Católica e demais religiões.
"Tínhamos, de facto,
liberdade religiosa e era bom regulamentá-la e ter uma lei, que hoje é
considerada uma lei modelo", disse.
Ainda assim, reconheceu que há
sempre margem para melhorar. Depois de 25 anos à frente da Comunidade Islâmica
de Lisboa, Abdool Vakil disse querer concluir as obras na Mesquita de Lisboa
para sair de cena.
Fonte: http://www.dnoticias.pt
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