Conflito entre religiões cria Tour Político em Belfast - Por Haroldo Castro


“O que ofereço aqui em Belfast é nosso Tour Político”, afirma Ken Harper, motorista de taxi da capital da Irlanda do Norte. “As batalhas dos anos 70 entre católicos e protestantes estão ilustradas em centenas de murais pela cidade. É um turismo bem diferente.” Quem tem mais de 40 anos (e costumava ler a seção internacional de jornais e revistas) deve se lembrar do conflito na Irlanda do Norte, onde bombas explodiam diariamente. Metade da população, leal à Inglaterra e professando a religião protestante, fazia questão que a Irlanda do Norte continuasse como parte do Reino Unido. A outra metade, nacionalista e católica, buscava a integração dos territórios britânicos ao seu país de origem, a Irlanda.

As diferenças políticas e religiosas transformaram Belfast em um verdadeiro inferno. Desde o final da década de 60 até o acordo da Sexta Feira Santa em 1998, uma bomba podia estourar em qualquer lugar. “As lixeiras públicas só voltaram a ser colocadas no centro da cidade apenas há alguns anos”, diz Ken. “Durante os conflitos, os atentados podiam ocorrer a todo instante.”

Duas grandes ruas simbolizam as diferenças entre os irlandeses (nacionalistas e católicos) e os pró-ingleses (protestantes e leais à Coroa Britânica). Shankill Road é o símbolo do reduto protestante. Quando chego ao bairro fico surpreso com os muros das casas, decorados por uma diversidade de murais coloridos. Ken conta que existem quase 2 mil em toda Belfast. Um dos murais mais impressionantes (foto acima) é o da UDA (Associação de Defesa do Ulster) e de seu braço terrorista UFF (Combatentes pela Liberdade de Ulster), leal ao Reino Unido. Ulster é o nome da província irlandesa mais ao norte da ilha, da qual seis condados fazem parte do Reino Unido e três estão na República da Irlanda, um país independente.

Outro mural mostra claramente o ódio entre as duas religiões e homenageia Oliver Cromwell, um general britânico do século 17. Em uma de suas frases, ele teria dito que a Igreja Católica, por contar com um grande poder político, precisava ser arrasada para que a paz pudesse existir na Irlanda. Entre os dois bairros de Belfast, ergue-se um longo e alto muro, tão lúgubre como aquele que existia em Berlim ou o atual entre Israel e os territórios ocupados da Palestina. Alguns trechos do muro, chamado ironicamente de Linha de Paz, elevam-se a quase oito metros de altura. Ainda hoje, vários portões de ferro são fechados toda noite. Em trechos do muro que separa o bairro protestante e católico existem espaços em branco que são usados por locais e visitantes. Em um deles, a brasileira Danuza F. M. deseja muita paz a todos.


O tour político de Belfast também passa pela artéria que representa o grupo católico, a Falls Road. Um dos murais mais coloridos, na sede de Sinn Fein (partido político criado pelos seguidores do IRA, Exército Republicano Irlandês) celebra Bobby Sands, um importante líder. Bobby foi preso quando era membro do Parlamento Britânico e na prisão entrou em uma irreversível greve de fome que o levou à morte em 1981, depois de 66 dias em jejum. A tendência esquerdista e internacionalista de Falls Road fez com que seus murais não tratassem apenas da causa irlandesa. Dezenas de pinturas homenageiam a luta dos bascos, dos cubanos e dos palestinos. Figuras negras norte-americanas como a de Frederick Douglass, do século 19, representam um símbolo da luta pela liberdade de expressão e de religião, assim como pelo fim da escravidão.

Fonte: http://colunas.epoca.globo.com/

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