Revolução da praça Tahrir põe religião no centro do debate político no Egito


Minorias religiosas temem que país se transforme numa república islâmica baseada na sharia

Egípcios vão às urnas nesta segunda eleger os parlamentares que vão elaborar a nova Constituição do país. A revolução egípcia de fevereiro de 2011, que derrubou o regime de Hosni Mubarak, inaugurou uma nova era na historia do país e abriu espaço na esfera política para a ascensão de grupos religiosos até então relegados à vida privada da população.


Muitas mesquitas e igrejas serviram como lugares de reunião de manifestantes e, durante os protestos, muçulmanos e cristãos rezaram juntos. 99% dos egípcios se declaram muito religiosos e afirmam que a religião desempenha um papel importante na sua vida diária. No entanto, as religiões tiveram um papel quase inexistente na vida política do país governado por Mubarak. Durante os 20 anos de governo autoritário, apesar das minorias religiosas (Coptas e Baha’i, por exemplo) terem sido marginalizadas, os privilegiados muçulmanos tinham seu poder controlado e limitado.

A campanha eleitoral e os debates para as eleições parlamentares que começam nesta segunda-feira (28/11) colocam em evidencia o papel prioritário que a religião tomou no Egito pós-revolução.

Embora a lei egípcia afirme que nenhum partido pode ser criado com base na religião, a realidade 'e muito diferente. Partidos como al-Wasat e o Partido da Liberdade e Justica (faceta política da Irmandade Muculmana) têm forte ligação com grupos religiosos. Lideres islâmicos, como Amr Khaled, um famoso pregador de televisão, criaram partidos políticos que refletem seus princípios religiosos, mas assumem o discurso de que estão promovendo a democracia e o processo eleitoral.

Nem todos os grupos religiosos têm a mesma possibilidade de se organizar politicamente. O Papa Shenouda III, chefe da Igreja Ortodoxa Copta, admite que um equivalente cristão das formações partidárias islâmicas é algo irreal e contraproducente. 

"Dada a historia de hostilidade para com os coptas no Egito, um partido não-muçulmano seria considerado radical pela opinião publica", afirma o líder religioso. E continua: "Estamos apenas aconselhando os coptas a estarem bem informados a respeito do programa de todos os partido".

Neste domingo (27/11), o Opera Mundi visitou a área copta do Cairo e constatou que no fim de cada missa, lideres religiosos não somente aconselhavam um determinado partido como indicavam em quem os fiéis deveriam votar de acordo com a sua zona eleitoral.

A ideia de um Egito secular, com um modelo inspirado na Turquia, parece longe de virar uma realidade. Uma das polêmicas que sempre voltam à tona no país é a inclusão da religião nos documentos de identidade dos egípcios. "No meu trabalho, todos sabem que sou copta por causa da minha identidade. Apesar de ter um nome neutro, não consigo nenhuma promoção e sempre trabalho mais que os outros. E' injusto", desabafa Sherif Ezzat.

Conseguir a aprovação para reforma de edifícios religiosos não-muçulmanos é uma tarefa quase impossível no Egito atual, assim como a alteração da identidade daqueles que se convertem do Islamismo a qualquer outra religião.  

"Nosso medo é que os islamitas consigam maioria no Parlamento e que quando decidam o comitê que vai escrever a Constituição, se baseiem na sharia (lei islâmica). Não quero ir embora do país, mas estou apreensivo com o futuro das minorias religiosas", afirma Nagui Chehata, professor de francês num colégio bilíngüe da capital.

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