Mais diálogo entre as religiões - Por Márcio Paschoal



Um filme anti-islâmico vem provocando ondas de protestos em países muçulmanos, abrindo o precedente para uma discussão polêmica: quais seriam os limites da liberdade de expressão e de religião?

Hoje muito se discute o poder e a vocação de toda liberdade de expressão. Proibir a manifestação do pensamento é pretender uma unanimidade autoritária, arbitrária e irreal.

Vivemos um tempo em que os limites são discutidos, um tempo de politicamente corretos, patrulhamentos ideológicos, revanchismos e fortes doses de falta de bom senso.

Contudo, é necessário um mínimo de ordem, de se delimitar para onde devemos ou podemos ir. Isso é fato. No entanto, não devemos esquecer que só a liberdade de pensamento possibilita a exteriorização dos conceitos. Assim aconteceu com a crença religiosa dos indivíduos, já que antes a pessoa era proibida de exteriorizar o seu pensar e mais ainda de divulgar a sua fé.

Nesse sentido procura-se entender por que as religiões, de uma maneira geral, permanecem num enfrentamento sem sentido, como se deuses fossem únicos e antagônicos, até com os que os aceitam como uma fraude, já que a liberdade de religião inclui ainda a liberdade de não seguir qualquer religião, ou mesmo de não ter opinião sobre a existência divina (agnosticismo e ateísmo).

Por isso ganha importância o que aconteceu no dia 11 de outubro, quando alunos dos colégios Liessin e Santo Inácio, no Rio de Janeiro, deram um exemplo de convivência pacífica e inteligente. Vinte estudantes do ensino médio da escola católica aprenderam um pouco sobre a história de Israel e sobre o Holocausto. O objetivo desse intercâmbio é que um grupo ganhe uma viagem para a Marcha da Vida, que passa por Israel e campos de concentração poloneses.

Em um momento no qual assistimos a uma divisão de povos irmãos através de guerras religiosas, nada mais oportuno e bem-vindo. Conhecer a origem e o histórico de uma nova religião é abrir a mente para se poder compreender a nossa própria crença. No caso do judaísmo e o cristianismo, então, a relação é ainda mais fundamentada: uma permite o melhor entendimento da outra.

Mas nem só de parentescos históricos falamos. Todas as demais religiões fornecem subsídios para que possamos compreender os mecanismos da fé. A máxima de que só ouvindo o outro lado, sem querer que este outro nos seja igual, atesta a liberdade de uma crença e permite que ela seja confirmada nos nossos corações. Mais que tolerância, reafirma-se a inteligência, o saber. Nenhuma religião prega a força bruta ou a violência.

Portanto, ainda há esperança enquanto os jovens procurarem o conhecimento em outras searas e tradições.

Fica a torcida para que novas empreitadas iguais a desses alunos se multipliquem, mesmo não chamando tanto a atenção da mídia como o filminho anti-islâmico. Há uma certa tendência para que notícias malévolas tenham mais transparência e notoriedade.

A única vocação dos alunos do Liessin e do Santo Inácio foi a busca pelo conhecimento e, a partir dele, da tolerância e da paz.

Já faz tempo que Kant preconizava: deixar-se guiar por mitos ou pelo pensamento de outrem, é abdicar da sua liberdade e viver num mundo de sombras.

*Marcio Paschoal mora no Rio de Janeiro, é compositor, crítico musical. Economista, letrista e escritor de vários livros. www.marciopaschoal.com

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