Filosofia ou religião? – Por Bárbara Reinhold



Há alguns anos aquilo que em princípio parecia uma  simples mudança de hábitos alimentares fez no entanto com que Santiago Magarinõs, 22 anos, passasse a dar novo sentido para sua existência a ponto de se sentir realizado num duplo sentido, como relata: “Quando você enche o estômago está também a se preocupar em preencher outras coisas da vida”. 

Em seu caso, a modificação da dieta se deu a partir de um familiar com câncer que, além de fazer os tratamentos convencionais, começou a investigar sobre outras formas de nutrição. Influenciado por isso Santiago também se interessou por essa questão jamais problematizada antes por ele.  Esta é uma das tantas alternativas se comparadas às religiões convencionais que alguns elegem na hora de buscar um caminho de plenitude e de respostas diante das incertezas geradas pela existência.

“Eu me apropriei disso e comecei a fazer investigações por minha conta. Comecei a frequentar mercados orgânicos; conhecer lugares onde se vende produtos sem agrotóxicos. Também fiz oficinas de alimentação alternativa, de modo que essas práticas passaram a ocupar um lugar central em minha vida cotidiana”, conta Santiago. Para ele, aprofundar esse tipo de mudança de hábitos implica indubitavelmente em experimentar uma nova forma de transcendência: 

“Modifica-se o contato com o corpo, com a comida, e com o outro, além de que, através dessa prática e do exemplo dos outros se aprende novas formas de alimentar e, sobretudo, se aprende novas formas de viver. Depois disso “eu também quis mudar os produtos de higiene e comecei então a usar desodorantes e sabonetes naturais. Essas práticas que em princípio pareciam simples me fizeram querer modificar também outros âmbitos mais profundos e sérios de minha vida. E esse fato pode ser considerado como uma nova filosofia; uma filosofia concebida a partir da terra e conduzida à vida prática e imanente”, disse ele.

Ao longo da história da humanidade, homens e mulheres sempre buscaram respostas para as questões da existência. O filósofo e docente da Universidade de Buenos Aires (UBA) Rubén Dri explica: 

“A religião existe desde que existe humanidade. Nasceu como uma necessidade humana e graças a essa necessidade a religião jamais desapareceu. Há, entretanto, que se distinguir entre aquilo que é religião e as instituições religiosas, como, por exemplo, a igreja católica, a protestante, as igrejas pentecostais, as dos povos primitivos ou o budismo, por exemplo. São entidades que tratam de dar respostas às inquietações dos seres humanos. Quando elas entram em crise, como está se sucedendo na cultura contemporânea, as pessoas passam a explorar ou buscar outros caminhos religiosos”.

Como no caso de Santiago também há outros tipos de experiências que possibilitam encontrar uma resposta aos problemas humanos e que, inclusive, podem substituir o papel das religiões convencionais. Luna Conejero Cohen, de 29 anos, nasceu numa família em que a meditação transcendental sempre é algo que faz parte do seu cotidiano: “Todos os dias medito. Quando me levanto tenho o costume de fazer uma prática de centramento e de conexão com um espaço específico que se poderia chamar aqui de ´ser´. Nesse caso, a religião para mim significa eu poder entrar em contato com esse espaço que está para além das crenças e dos dogmas”, afirma ela.

Há, porém, outras pessoas para as quais a busca se focaliza no mundo exterior e no coletivo. Luciana Carolina Gómez, de 19 anos sempre foi interessada em Política. Durante o segundo grau foi líder estudantil num Diretório Acadêmico e atualmente milita no partido Novo Encontro: 

“Esse é meu estilo de vida e gera em mim muita alegria e paixão como seguramente deve ser experimentado pelas pessoas que praticam alguma religião. Não concebo minha vida sem a política de modo que eu não seria eu mesma nem seria feliz sem ela. Através da Política, sinto-me, imeditamente envolvida com as diferentes problemáticas da vida social”, afirma Luciana.

Com relação à essas práticas, o filósofo Rubén Dri explica que no fundo podem ser consideradas experiências similares às “buscas religiosas de pessoas que frequentam alguma religião à medida que os sujeitos que tem uma vida social comprometida encontram aí determinadas respostas para as questões da existência”. Luis Miguel Donatello, sociólogo, investigador do CONICET (Conselho Nacional de Investigações Científicas e Técnicas da Argentina) e docente da Universidade de Buenos Aires, refere-se à substituição da religião por outras filosofias de vida: 

“Trata-se de um tema antigo mas que aparece em momentos de crise de sentido muito comum na pós-modernidade. As pessoas perdem as referências habituais e em meio a isso experimentam um desenraizamento cultural de tal monta que as crenças e as formas tradicionais de pensar e de atuar de certas religiões vão se diluindo ao mesmo tempo em que surgem ou se recuperam novas formas religiosas”. 

O sociólogo sustenta que isso faz com que as pessoas criem cada vez mais, por conta própria, uma multiplicidade de coisas e práticas religiosas muito diversas e, por outro lado, elas acabem por inventar ortodoxias que antes não existiam. Segundo o especialista, percebe-se hoje um nítido deslocamento na busca do sentido. As pessoas migram do mundo religioso para outras esferas, como para o de uma ONG, o de um partido político, ou o de uma causa ecológica ou humanitária, por exemplo, algo que, segundo ele, acontece, sobretudo, com pessoas que até pouco se diziam católicas.

Enfim, atualmente se constata diferentes vivências e caminhos alternativos da e para a religião que por sua vez oferecem respostas diversas diante das perguntas a respeito do sentido da existência.




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