Sincretismo e tradição: as religiões afro-brasileiras no Pará – Por Yuri Coelho


As religiões afro-brasileiras são recriações a partir de fragmentos de práticas religiosas e de sistemas de crenças de diversos grupos africanos que vieram para o Brasil na condição de escravos. Tais religiões também são chamadas de religiões de matriz africana. 

A professora da Faculdade de Ciências Sociais, Marilu Campelo, é pesquisadora da religiosidade afro-brasileira. É ela que nos explica como essas práticas religiosas estão presentes, hoje, na Amazônia.

Presença na Região

A pesquisadora afirma que o que há de mais notório na questão da religiosidade afro-brasileira na Amazônia não é a influência, mas, sim, um jogo de trocas entre as religiões de matriz africana e o catolicismo popular.

De acordo com Marilu Campelo, o número de seguidores destas crenças é grande, “na última pesquisa, realizada na zona metropolitana da capital paraense com a intenção de mapear os terreiros, foi descoberto um número de 1.089, sendo 60% deles na capital, Belém”.

Os terreiros estão presentes em todos os bairros da cidade e nos distritos também, mas “a maior incidência é no bairro da Pedreira, conhecido como o bairro do samba, do amor e da magia, seguido pelos bairros Guamá e Jurunas”, expõe a professora. Estes terreiros podem ser de Umbanda, Candomblé ou Mina.

Umbanda

Há elementos das religiões dos povos bantos, grupo etnolinguístico localizado, principalmente, na África subsaariana, que engloba cerca de 400 subgrupos étnicos diferentes, extremamente monoteístas e dedicados ao culto de mortos, do catolicismo, dos ritos e das crenças indígenas e de outras crenças espiritualistas (entre eles, o espiritismo kardecista, o esoterismo etc.). É uma prática religiosa que se desenvolveu a partir do início do século XX, tendo uma rápida expansão pelo País.

No Pará, a Umbanda foi introduzida na década de 30, pela Mãe de Santo Maria Aguiar, que trouxe essa modalidade de culto do Rio de Janeiro para Belém, mesclando a Umbanda com a Mina Nagô, inovação que teve muito sucesso, tendo sido largamente difundida.

Mina

Os terreiros de Mina Nagô ou Mina do Pará representam a tradição afro do Pará. É uma tradição considerada sincrética, pois é uma mistura da tradição maranhense (Tambor de Mina), fortemente influenciada pela tradição baiana (Candomblé). No entanto são inegáveis as semelhanças existentes entre o Tambor de Mina maranhense e o culto Mina Nagô, designado de tradição afro-paraense. No processo histórico de formação dessa religião de matriz africana, o culto às divindades expandiu-se tanto para São Luís quanto para Belém.

No Pará, esse culto teria se misturado com a pajelança, recebendo a influência da Umbanda, nos anos 30, e por volta da década de 50 e 60, a influência do Catolicismo. Durante muito tempo, foi considerada como uma variante do próprio Candomblé. Por meio de pesquisas, das quais participaram professores da UFPA, foram descobertas características singulares, caracterizando-o como um culto à procura de uma identidade e de uma tradição.

Candomblé

Religião que cultua basicamente os Orixás dos povos bantos, vistos como ancestrais divinizados que passaram a ter controle sobre a natureza. A crença do Candomblé procura a harmonia com a natureza e seus deuses, transmitindo o axé, força mágica e sagrada que anima a vida, recriando um elo perdido com a escravidão: a ancestralidade. Esse poder é transmitido aos homens, que podem aumentá-lo ou diminuí-lo, de acordo com a sua própria vontade, seja pelo ritual de iniciação, seja por comportamentos que busquem a harmonização do indivíduo com o mundo que o cerca.

O Candomblé foi introduzido no Pará por intermédio de um pai de santo, Astianax Gomes Barreiro, conhecido como Prego. A partir da década de 70, dois movimentos consolidaram sua presença na capital paraense: o primeiro, por iniciativa de paraenses que foram a Salvador "fazer o santo", que é o ritual de iniciação no Candomblé. O segundo, por meio da vinda de pais e mães de santo baianos e cariocas, que vieram para a região iniciar os “filhos” e acabaram por instalar-se na cidade, passando a construir uma tradição para o Candomblé na região.

Data celebra as religiões de matriz africana em Belém, O dia 18 de março foi dedicado aos umbandistas e aos afro-religiosos, por meio da Lei Municipal nº 8272/ 2003 e da Lei Estadual nº 6.639/ 2004. A data também registra a história de luta de Rosa Viveiros, também conhecida como Nochê Navanakoly ou “Mãe Doca”.

A homenagem é uma celebração à memória da luta de Nochê Navanakoly, que era maranhense, e, em 1891, apenas três anos após a abolição da escravatura, enfrentou o racismo e outros preconceitos da época e inaugurou seu terreiro de Tambor de Mina na capital paraense.

Mãe Doca foi presa várias vezes porque cultuava as divindades africanas e preservava as tradições de matriz afro-amazônica, mesmo assim, manteve seu terreiro, que dava lugar para a manutenção das tradições de sua origem negra africana. 

Pelo reconhecimento da importância de manter viva  a memória dessa luta, Mãe Doca tornou-se o símbolo de resistência das religiões de matriz africana no Pará e, em sua homenagem, é celebrado o dia da Umbanda e das religiões afro-brasileiras.




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