As manifestações populares, as igrejas, os políticos evangélicos: para onde estão voltadas as atenções na mídia religiosa? - Por Magali do Nascimento Cunha

A Aliança de Batistas do Brasil (ABB) divulgou nota da presidente Pra. Odja Barros, com "total e irrestrito apoio às manifestações populares e democráticas que vêm acontecendo em todo território nacional, desencadeada pelo movimento 'Passe Livre', cuja pauta principal se baseia na reivindicação de um transporte público de qualidade e com tarifas mais justas e menos abusivas ao tempo que também denunciam os valores imorais que foram e estão sendo gastos na construção dos estádios de futebol para receber a copa das confederações e a Copa do Mundo em 2014". 

A ABB denuncia na nota que a "nação continua sofrendo com a falta de infraestrutura básica (saneamento, educação pública de qualidade, saúde, segurança, emprego entre outras necessidades de primeira hora), enquanto assistimos à nação se dobrando a regras da FIFA e aceitando suas condições injustas e excludentes que afastam nosso povo trabalhador daquela que seria a festa do povo e do esporte". 

O pronunciamento também registra a oposição da ABB à PEC-37 e ao mesmo tempo lamenta a forma como vem sendo tratada a agenda indígena no Brasil. O texto conclui com o desejo de que "estas manifestações contagiem a nação levando-nos a vencer o comodismo e através da luta democrática, o povo brasileiro possa ter sua voz e direitos respeitados". 

Traz ainda o reconhecimento de que "sair às ruas é um direito legítimo, desde que as pautas reivindicadas, sejam pautas coletivas e que visem o bem-estar de toda uma nação". 


A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, da Igreja Católica Romana (CNBB) publicou nota em que manifesta "solidariedade e apoio às manifestações, desde que pacíficas, que têm levado às ruas gente de todas as idades, sobretudo os jovens" e afirma: 

"uma sociedade em que as pessoas têm o seu direito negado sobre a condução da própria vida, a presença do povo nas ruas testemunha que é na prática de valores como a solidariedade e o serviço gratuito ao outro que encontramos o sentido do existir. A indiferença e o conformismo levam as pessoas, especialmente os jovens, a desistirem da vida e se constituem em obstáculo à transformação das estruturas que ferem de morte a dignidade humana. As manifestações destes dias mostram que os brasileiros não estão dormindo em “berço esplêndido”. 

A CNBB cobra que o Estado garanta o direito democrático às manifestações e diz que se espera de todos o respeito à paz e à ordem. 


O bispo Robson Rodovalho da Igreja Sara a Nossa Terra publicou texto em que elogia a atitude dos jovens nas manifestações mas chama a atenção para um objetivo claro nos protestos. Para ele mais importante do que sair às ruas é não ficar nelas quando não se tem um propósito ou quando esse propósito não for democrático. 


“É a partir da democracia que tudo se constrói. Todos temos descontentamentos, mas ‘ferver’ nas ruas, sem abrir o diálogo, tende a ser pior do que melhor”, disse. 


Além da aprovação destas lideranças e igrejas às manifestações e estímulo à participação, é expressivo o número de pessoas ligadas a igrejas que participam do movimento e deixam claro que o fazem na condição de cristãs. 


Nas ruas, vários manifestantes exibem cartazes fazendo uso do termo "protestante" como expressão da razão de sua presença e participação.

A posição dos políticos evangélicos

Da parte dos políticos evangélicos há muita cautela em expressar opiniões. Somente o deputado Marco Feliciano se pronunciou nos primeiros momentos: "O País está à sombra da Anarquia. No Estado Democrático de Direito, protestos pacíficos são legítimos, a baderna e a violência não. Somos uma democracia jovem. Estamos aprendendo a lidar com o grande presente nos dado pela Democracia: a liberdade. Um dia chegaremos lá.” 

Já o pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia se mostrou favorável aos protestos, mas condenou " "interesses políticos e os atos de vandalismo": “No Brasil o perigo são os esquerdopatas ultrarradicais que pregam baderna, vandalismo, derramamento de sangue, para que possa haver uma verdadeira revolução. Métodos comunistas e de reacionários estão falidos, mas que eles querem ressuscitar”, escreveu. 

Outro perigo que o líder religioso cita é o surgimento de manifestações para atingir o que ele chama de “objetivos inescrupulosos”. “Manifestação pacífica por um tempo determinado, sim! Baderna e vandalismo, mil vezes não!”, disse o pastor. 

Depois do pronunciamento da Presidenta Dilma Rousseff no dia 21 de junho, com proposta de cinco pontos por um pacto pelo Brasil, o pastor Malafaia criticou pelo Twitter o fato de a governante ter chamado líderes católicos romanos e não evangélicos para o diálogo e ameaçou que nada muda para os evangélicos apenas no voto para "eles":


Na verdade, um pastor evangélico participou de reunião da Presidenta Dilma com movimentos urbanos em 25 de junho. O pastor da Comunidade Cristã Reformada Ariovaldo Ramos esteve na reunião. O Blog Mídia, Religião e Política aguarda um depoimento dele sobre o nível em que se deu esta participação. 

Onde estão as atenções: Marcha para Jesus e "Cura Gay"

As atenções destes e de outros grupos evangélicos que têm espaços nas mídias, de fato, estão voltadas para dois elementos um tanto distantes das manifestações populares e suas demandas: 

(1) a Marcha para Jesus promovida anualmente em São Paulo pela Igreja Renascer em Cristo, que acontecerá no sábado 29 de junho, pela primeira vez com transmissão da Rede Globo de Televisão, com pelo menos 12 trios elétricos e a apresentação de várias celebridades do universo gospel; 

(2) o embate do deputado Marco Feliciano com as mídias que o teriam injustiçado ao divulgarem a aprovação do Projeto de Decreto Legislativo 234/2011 na Comissão de Direitos Humanos da Câmara, denominando-o de "projeto de cura gay".

Se a Marcha para Jesus vai ganhar conotação política em 2013 é preciso aguardar a realização para avaliação. Quanto ao embate do deputado Marco Feliciano com as mídias, ele divulgou um vídeo em 25 de junho, que tem tido ampla circulação na internet em que afirma que o apelido dado pela mídia ("cura gay") "juntamente com os ativistas gays" é uma distorção da proposta di deputado João Campos (PSDB-GO), autor do projeto. Ele classifica o caso de “desonestidade intelectual". 

O deputado explica que a origem do projeto está no fato de o proponente ter ouvido queixas de psicólogos contra a resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP), que limita a atuação dos profissionais da área no tema.

“Não existe ‘cura gay’ porque homossexualidade não é doença. Fique isso aqui bem claro”, disse Feliciano, que contra-atacou as acusações de preconceito, dizendo que o termo “cura” foi usado apenas pelo CFP no parágrafo único do artigo 3º de sua resolução.

Marco Feliciano se exalta quando compara a “maldade” da mídia ao criar apelidos para projetos de lei que tenham relação com temas ligados aos Direitos Humanos, como o projeto chamado de Estatuto do Nascituro, que cria leis de proteção ao feto, apelidado de “bolsa estupro”.

O parlamentar ressaltou ainda que a Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) era uma “comissão vazia” antes de sua posse, e que sua iniciativa de colocar o PDC 234/2011 (apelidado de “cura gay”) para votação se deu porque ele era o único projeto em tramitação na comissão que tinha “relatoria pronta”, indispensável para que seja dado andamento.

O conteúdo do vídeo do deputado Marco Feliciano é uma ampliação do pronunciamento do pastor Silas Malafaia em 20 de junho, quando classificou a postura da imprensa na divulgação da notícia como “uma afronta à inteligência humana”. 

Grande parte dos veículos de comunicação transmitiu a ideia de que o projeto impõe aos psicólogos a obrigação de tentar reverter a preferência sexual de homossexuais. “A imprensa brasileira na sua grande maioria engole tudo o que o ativismo gay promove, como verdade absoluta, sem o mínimo de análise imparcial”, afirmou Malafaia.

“O projeto tem a ver com Direitos Humanos. Nenhuma entidade de classe profissional, religiosa ou quem quer que seja, pode impedir uma pessoa de buscar ajuda se ela assim desejar e decidir. O que o Conselho Federal de Psicologia fez ao impedir que psicólogos tratem de homossexuais que vão pedir ajuda sobre a sua sexualidade, é uma afronta a Constituição e a própria ciência. Por que um heterossexual pode pedir ajuda a um psicólogo sobre sua sexualidade e um homossexual não? Em que parâmetros científicos e também legais você pode impedir um profissional de ajudar quem o procura?”, questionou o pastor Malafaia, que se apresenta também como psicólogo.

Segundo o pastor, a postura contrária ao projeto por parte do CFP se deve a uma ideologia política, e não segue parâmetros mundiais na área: 

“O Conselho Federal de Psicologia está ideologizado pelos ‘esquerdopatas’ e pelo movimento gay. Pasmem os senhores: nenhum conselho ou sociedade de psicologia no mundo tem uma resolução tão imbecil e esdrúxula como esta. Em nenhum lugar do mundo o psicólogo é impedido de tratar quem o procura. É vergonhoso ver as ciências humanas virarem ciências exatas e servir ao ativismo gay”, criticou.

Em seu texto, o pastor Silas Malafaia resume sua crítica dizendo que houve distorção dos fatos: “A safadeza da questão é que querem passar para a sociedade como se alguém estivesse obrigando os homossexuais a mudarem o seu comportamento, porque todos nós sabemos que qualquer psicólogo e médico que queira impor um tratamento a uma pessoa que não o deseja, é passivo de punição”, escreveu.

É curioso que os pastores em evidência questionem a linguagem das mídias, como redutora, pois é a mesma linguagem redutora utilizada no caso do material sobre educação contra a homofobia produzido pelo Ministério da Educação, em 2011, classificado como "Kit gay" e assim divulgado nos espaços destas mesmas lideranças na TV e na internet como oposição.


O que o texto do projeto propõe é que o Congresso Nacional suste a aplicação conteúdo de Resolução do Conselho Federal de Psicologia nº 1/99, que estabelece normas de atuação para os psicólogos em relação à questão da orientação sexual não permitindo que psicólogos patologizem comportamentos ou práticas homoeróticos e adotem ação coercitiva para orientar homossexuais para tratamentos não solicitados, nem que colaborem com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades ou que se pronunciem publicamente de modo a reforçar preconceitos sociais existentes em relação a homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica. 

Se o Congresso sustar os artigos 3 e 4 que preveem estas posturas, psicólogos estarão liberados para patologizarem comportamentos ou práticas homoeróticos, para adotarem ações coercitivas para orientarem homossexuais para tratamentos não solicitados, para colaborarem com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades ou ainda para se pronunciem publicamente de modo a reforçarem preconceitos sociais existentes em relação a homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica. Atos contrários ao "projeto da cura gay" foram realizadas em várias das manifestações públicas que estão ocorrendo neste junho.
Fontes: 
http://noticias.gospelprime.com.br/feliciano-protestos-em-sao-paulo/http://noticias.gospelprime.com.br/manifestacoes-pacificas-silas-malafaia/http://noticias.gospelmais.com.br/malafaia-postura-imprensa-cura-gay-afronta-inteligencia-55865.html 
http://noticias.gospelmais.com.br/video-marco-feliciano-desonestidade-midia-nao-cura-gay-57348.html









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