Votar com deus? – Por Walter Sorrentino

A temporada eleitoral está em ação, mas mudança qualitativas (ou não) dos cenários, só após o programa eleitoral e os debates entre os candidatos. 

Por ora o que existe é imenso trabalho em busca do eleitor nas campanhas estaduais, um corpo a corpo efetivo. Claro, os candidatos presidenciais se esmeram em declarações, fotos, fatos políticos; mas o que predomina por ora não é o debate, apenas a rinha de galos pretendendo aprisionar a dinâmica da disputa em marcos estreitos. Isso se alterará a partir de meados deste mês.

Mas há um dado nesse interregno que são os evangélicos. Na falta de debate maior sobre um projeto de nação, a mídia se esforça por decifrar a esfinge do comportamento eleitoral de 22,2 milhões de fiéis evangélicos das mais variadas seitas pentecostais, neopentecostais e não pentecostais. Assunto para dicionário histórico.

De fato, reside nesse terreno um reduto do ideário meritocrático que talvez seja mais uma “ideia fora de lugar” nos trópicos. O fato é que esse ideário assume abertamente um caráter moralmente conservador sobre a vida e a família, temas como aborto, uniões homoafetivas e drogas.

Eles cresceram socialmente mas o ritmo não se manteve. Atingiram por volta de 10% da representação política na Câmara dos Deputados. Alcançaram o atual estágio à base de impérios midiáticos e muita comunicação de massa. Falta citar as “maquininhas de cartão” que infestaram mesas na inauguração do novo Templo de Salomão de Edir Macedo.

Aí se incuba uma tendência ainda por decifrar do ponto de vista eleitoral. É certo que são alimentados pela nova pirâmide social do país, após a exitosa distribuição de renda dos últimos 12 anos. Certo também que, apesar de todo o sentido de seitas religiosas, há imenso grau de sincretismo no comportamento dessas camadas, seja religioso, seja comportamental. 

Segundo alguns, mesmo do ponto de vista dos cultos as fronteiras não são rígidas. E como compreender toda a abertura causada pela dramaturgia brasileira lidando com os mesmos temas comportamentais, com amplo apelo popular, com as restrições impostas pelas religiões aos seus fiéis?

Eleitoralmente, a questão relativamente nova é a entrada desses segmentos em disputas majoritárias. Improvável que entrincheirados em um segmento demarcado da sociedade alcancem vitórias; mais provável é que almejam estender influência, acumular forças, “vender o produto”. 

Mesmo o pastor Everaldo, candidato a presidente, fez algum sucesso inicial, estagnou e está longe de marcar, segundo creio, o processo deste ano, mormente se ele for devidamente politizado. Chamou muito a atenção o resultado de 2012 relativo às candidaturas de Celso Russomano em São Paulo e Ratinho Jr. em Curitiba.

Ademais, estão divididos politicamente. A Universal do Reino de Deus, com 1,8 milhão de fiéis, tem a TV Record. Apoiou em 2010 e apoiará Dilma, com o bispo Edir Macedo e o senador Crivella. A Assembleia de Deus, tem 10,3 milhões de fiéis. Já rachou no apoio pretendido ao candidato pastor Everaldo e Eduardo Campos.

A Assembleia de Deus Madureira, tem 40 mil seguidores e o pastor Manoel Ferreira apoia o pastor Everaldo. Este conta também com a Igreja Sara Nossa Terra, do bispo Rodovalho, com 300 mil fiéis e a Associação Vitória em Cristo, de 10,3 milhões de fiéis, do pastor Silas Malafaia: era Serra em 2010, está hoje com o pastor Everaldo. A Convenção Geral das Assembleias de Deus, dirigida por José Wellington Bezerra da Costa, com 10,3 milhões, idem: era Serra em 2010, aproxima-se Everaldo. Com Aécio definidamente está a Igreja do Evangelho Quadrangular, com 1,7 milhões de fiéis.

Enfim, nada é certo quanto ao comportamento eleitoral desse estrato. O que mais provavelmente predominará é a inteligência do eleitor em decifrar o que está em jogo nas eleições em sua vida concreta cotidiana: saúde, mobilidade urbana, educação, segurança, emprego, renda do trabalho, inflação etc., etc. 

O programa eleitoral e os debates poderão alinhar em boa parte a atual sensação de mal-estar presente na sociedade e os evangélicos não estarão à margem desse debate mais amplo de toda a sociedade. É por aí que se deve disputá-los politicamente.

Artigo do médico e Secretário Nacional de Organização do PCdoB, Walter Sorrentino, do blog Projetos para o Brasil.





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