A religião no debate eleitoral – Por Carmadélio Sousa

A democracia autêntica respeita as crenças e não crenças dos cidadãos, que têm o direito de expor suas percepções no debate.

A religião é elemento importante da constituição histórica e cultural do povo brasileiro e não poderia ficar fora dos debates no período eleitoral. O bom político não é aquele que traz ideias prontas, mas aquele que é capaz de interpretar os anseios da população. 

Isso inclui os valores religiosos dos que votam e escolhem seus candidatos. Esses valores se não podem ser impostos ao Estado em sua saudável laicidade, não podem muito menos serem desprezados como de menor importância. 

Um debate que não exclua os valores religiosos e éticos interessa a grande parte da população brasileira que é confessadamente cristã. A laicidade do Estado é exatamente a neutralidade e o respeito às manifestações religiosas e culturais, inclusive dos que não tem credo. 

Entender os valores religiosos como pertencentes apenas a consciência individual e escondê-los do debate público é uma deformação da laicidade. 

A democracia autêntica respeita as crenças e não crenças dos cidadãos, que têm o direito e em alguns casos, até o dever, de expor suas percepções no debate público. Alijar essas percepções seria a imposição de uma visão materialista que não corresponde a índole da esmagadora maioria da população. 

As religiões são capazes de trazer ao debate público a marginalização dos mais pobres; oferecer esperança aos que esperam as promessas; trazer motivações para o debate e mostrar o homem inteiro em sua natureza, levando–o a ir além de suas necessidades imediatas.

Um debate saudável e democrático leva em conta opiniões divergentes como contribuição na busca de um consenso que responda ao desejo da maioria. Sem a dimensão religiosa a sociedade pode se tornar presa fácil das ideologias totalitárias. 

A sociedade precisa de instância que a transcenda e a questione, que a “desestabilize” em suas convicções relativistas, interesseiras e circunstâncias, mostrando que nem só de pão vive o homem.

A liberdade de expressão religiosa não é concessão ou favor do Estado mas direito humano que tem na democracia e especialmente agora em tempo de eleições uma forma de afirmar valores. Negar isso é negar um dos pilares da democracia que é a liberdade de expressão. 

Uma liberdade de expressão que não permita, especialmente agora que se decide o futuro da nação, a contribuição dos valores da religião como uma contribuição para o debate público seria uma contradição tanto com a democracia quanto com a liberdade. 

Essa contribuição não significa imposição da religião para o Estado leigo, nem a imposição da religião para os que não a tem, mas uma contribuição que, se bem compreendida, pode nos ajudar a construir o Brasil que todos nós cidadãos queremos, religiosos ou não.


Carmadélio Sousa - carmadelio@comshalom.org
Historiador e membro da comunidade católica Shalom



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