Astro do golfe, que se vê "cablinasiano", realimenta discussão racial nos EUA - Por Sérgio D'Ávilla


Em 1997, durante entrevista à apresentadora de TV Oprah Winfrey, Tiger Woods se definiu como "cablinasian". O neologismo em inglês foi cunhado pelo próprio jogador de golfe e junta as palavras "caucasian" (caucasiano, ou branco), "black" (negro), "indian" (índio) e "asian" (asiático). Foi a palavra que ele se inventou na adolescência, disse, para resolver um problema: o que declarar no quesito "raça" ao preencher as fichas de competição.

No programa de TV, Woods definiu sua composição étnica como "25% negro, 25% tailandês, 25% chinês, 12,5% branco e 12,5% nativo-americano". Daí o "cablinasian", ou, aportuguesando, "cablinasiano". Desde então, passou a viver numa espécie de limbo racial: os negros o rejeitaram, dizendo que ele tinha vergonha de ser um deles, e os outros acharam a história esquisita demais, como se Woods tivesse dito que era vulcano, como o sr. Spock, de "Jornada nas Estrelas".

A revelação recente de que ele teria tido pelo menos nove amantes -fala-se agora em 11- enquanto casado com sua atual mulher, uma sueca loira de olhos azuis, reavivou a discussão entre articulistas norte-americanos, numa polêmica que extrapolou as páginas e os programas dos cadernos de esporte dos jornais. Um deles, Eugene Robinson, articulista negro do "Washington Post", escreveu que o incomodava particularmente o fato de que todas as supostas amantes terem um mesmo traço, que ele definiu como similares à boneca Barbie.

Foi o suficiente para que entidades feministas acusassem Robinson de sexista e entidades negras chamassem Woods de racista. "Por que é que quando eles [os homens negros] chegam a esse nível de sucesso, tendem a ir diretamente para a loira mais próxima?", perguntou-se Denene Millner, autora de livros sobre relações raciais. Em comparação, quando o nadador Michael Phelps foi pego fumando maconha, para ficar em exemplo recente de outra estrela do esporte norte-americano envolvido em escândalo, a absorção do caso pela opinião pública foi mais simples. Ele assumiu o erro, pediu desculpa, e a vida continuou. Os Estados Unidos não sabem exatamente o que fazer com seu "cablinasiano" mais rico e famoso.

Obama

Ajuda o fato de o componente racial ter adquirido relevância extraordinária no país desde a eleição do democrata Barack Obama, o filho de branca americana e negro africano criado por um padrasto indonésio que é ele próprio um Tiger Woods da política no quesito complexidade étnica. A exceção são as empresas que o bancaram ao longo dos últimos anos. Essas sabem muito bem o que estão fazendo: abandonando o barco. A consultora Accenture anunciou que cancelou o contrato com o esportista, a Gatorade avisou que interromperia uma linha baseada em seu nome, a Gillette disse que reduzirá seus patrocínios e a operadora AT&T e a fabricante de relógios Tag Heuer afirmam estar "reavaliando" seu relacionamento publicitário com o esportista. Aqui também o padrão parece ser duplo. Há poucos meses, depois de sofrer chantagem, David Letterman veio a público assumir diversos casos que teve com funcionárias de seu programa -e não perdeu um anunciante por isso até hoje.


Fonte: http://www1.folha.uol.com.br

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

"Negociar e acomodar identidade religiosa na esfera pública"

Pesquisa científica comprova os benefícios do Johrei

A fé que vem da África – Por Angélica Moura