Intolerância religiosa aumenta na Indonésia - Por Benedict Rogers


Poucos dias após o concerto de Lady Gaga na Indonésia ter sido cancelado após protestos de grupos islâmicos, eu voei 1.370 quilômetros de Jacarta para Padang, Sumatra Ocidental, e dirigi mais 130 quilômetros, uma jornada de quatro horas por estradas de terra sinuosas, até Sijunjung, para visitar um ateísta indonésio preso por suas crenças.
Alex Aan, um funcionário público de 30 anos, é um homem gentil, de fala mansa e altamente inteligente que abandonou sua crença em Deus quando viu pobreza, guerra, fome e desastre por todo o mundo.
Ele pode pegar até seis anos de prisão, acusado de blasfêmia, disseminação do ódio e do ateísmo. Muçulmanos radicais invadiram seu escritório, o espancaram e chamaram a polícia após lerem sobre seus pontos de vista no Facebook.
Alex é o primeiro ateísta na Indonésia a ser preso por suas crenças, mas seu caso é sintomático de um aumento da intolerância religiosa no maior país muçulmano do mundo. No domingo anterior, eu me juntei a uma pequena igreja em Bekasi, um subúrbio de Jacarta, para uma missa, mas encontrei a rua bloqueada por uma multidão barulhenta e furiosa e alguns poucos policiais.
A igreja, conhecida como HKBP Filadelfia, foi forçada a fechar poucos anos atrás, apesar dos tribunais locais lhe terem dado permissão para abrir. O prefeito local, sob pressão dos islamitas, declarou uma política de “zero igreja” em sua área. Nos últimos dois meses, a congregação foi impedida de rezar na rua, do lado de fora de seu prédio, e o clima está ficando cada vez mais tenso.
Quando estive lá, eu sentia que a violência poderia estourar a qualquer momento. Os radicais que controlavam o alto-falante gritavam “Cristãos, vão embora” e “cacem qualquer pessoa não usando um jilbab (lenço de cabeça)”.
Os líderes mundiais e comentaristas gostam de apontar a Indonésia como modelo de tolerância e pluralismo, um exemplo de como o Islã e a democracia não são incompatíveis. Até certo ponto eles estão certos, a Indonésia tem uma grande tradição de pluralismo, um tipo de Islã em geral tolerante e realizou uma transição notável de autoritarismo para a democracia.
A maioria dos muçulmanos indonésios permanece moderada e fica atônita com o aumento da intolerância. Mas três fatores estão minando a liberdade religiosa: o silêncio e passividade da maioria, o aumento da radicalização e a fraqueza do governo em todos os níveis.
Não são apenas a tolerância e a liberdade religiosa que estão sob ameaça, mas também o estado de direito. Outra igreja, a GKI Yasmin em Bogor, a uma hora de Jacarta, teve aprovação da Suprema Corte para abrir, mas o prefeito local, novamente sob pressão dos islamitas, se recusa a permitir. Um prefeito de distrito desafia uma decisão da Suprema Corte e ninguém diz nada.
A comunidade muçulmana Ahmadiyya talvez seja a mais perseguida. Ataques violentos contra esse grupo, cujas crenças são consideradas heréticas por muitos muçulmanos conservadores, têm aumentado significativamente. No ano passado, eu encontrei vítimas de um dos piores surtos de violência, um ataque contra os ahmadis em Cikeusik, em 6 de fevereiro de 2011, que deixou três mortos.
Um homem descreveu ter sido totalmente despido e espancado severamente enquanto um facão era mantido em sua garganta. Ele foi arrastado pelo vilarejo e jogado em um caminhão como um cadáver. Outro homem fugiu em uma corredeira de rio, perseguido por agressores que atiravam pedras e gritavam “mata, mata, mata”.
Ele se escondeu no mato, molhado e sob frio extremo, por quatro horas. Um terceiro sofreu uma fratura na mandíbula, enquanto um quarto, perseguido por homens armados com foices, facões e lanças, foi detido pela polícia três dias depois, tratado como suspeito, não como vítima.
Dentre as 1.500 pessoas que atacaram os 21 ahmadis, apenas 12 foram presas e processadas, segundo o “New York Times”. A sentença delas foi entre três e seis meses.
Esses estão longe de serem os únicos casos. No início deste mês, radicais atacaram uma palestra do muçulmano liberal canadense Irshad Manji. Em Aceh, 17 igrejas foram forçadas a fechar.
Eu conheci outros pastores que falaram sobre suas igrejas serem fechadas, e uma mulher, a reverenda Luspida, que foi espancada enquanto uma pessoa de sua congregação foi esfaqueada. “Nós não temos mais liberdade religiosa aqui”, ela me disse. 
“Nós precisamos mandar uma mensagem ao presidente. Ele não pode dizer que a situação é boa aqui. Nós precisamos lembrá-lo que nossa situação é muito crítica e ele deveria fazer algo pelo futuro da Indonésia. O apoio de fora é muito importante para pressionar o presidente.”
Enquanto a Indonésia passa pela Revisão Periódica Universal do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas – um processo aplicado periodicamente a todos os países membros, questões sérias deveriam ser feitas sobre o futuro do país. Se uma medida não for tomada, as realizações da Indonésia ao longo da última década podem ser ameaçadas.
Não é tarde demais. Há algumas organizações muçulmanas indonésias excelentes como o Instituto Wahid, fundado pelo ex-presidente Abdurrahman Wahid, e o Instituto Maarif, cujo trabalho deve ser apoiado.
Se o presidente Susilo Bambang Yudhoyono agisse, ele contaria com o apoio da maioria silenciosa. Seu governo fez progresso no combate ao terrorismo, mas não deveria se esquivar da responsabilidade de combater a ideologia por trás do terror. Seu governo deveria parar de ceder aos radicais e começar a proteger os direitos de todos indonésios de escolher, mudar e praticar sua religião, como dita o Artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Eu fui me encontrar com Alex Aan porque, como cristão, eu acredito na liberdade religiosa, que inclui o direito de não acreditar.
(Benedict Rogers trabalha para a organização internacional de direitos humanos Solidariedade Cristã Mundial, com sede em Londres.) (Tradução: George El Khouri Andolfato).

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