Sarzedo e Nova Lima/BH são municípios vizinhos, mas não irmãos na fé – Por Gustavo Werneck


Próximas na geografia, Sarzedo e Nova Lima estão distantes na religiosidade. A primeira tem mais de 40% da população formada por evangélicos. A segunda é a cidade da Região que menos perdeu católicos.

Quase vizinhos em território, mas com sedes municipais distantes, Nova Lima e Sarzedo têm realidades econômicas, populacionais e culturais bem diferentes. A religiosidade também é bem antagônica nas duas cidades. 

Sarzedo tem hoje quase metade (40,5%) da população de 32 mil habitantes formada por evangélicos, houve aumento de 14 pontos percentuais desde 2000 (26,3%), e 90 igrejas tradicionais ou históricas, que incluem a Batista, as pentecostais e neopentecostais. O crescimento tem explicação, diz o presidente do Conselho de Pastores e Líderes Evangélicos de Sarzedo (Copales), pastor Edmilson Miguel Júlio, da Igreja Quadrangular, localizada no Bairro Brasília.

“O crescimento ocorreu depois da criação, há nove anos, do Copales. Resolvemos seguir o verdadeiro sentido da palavra igreja, que vem do grego e significa ‘chamados para fora’ e ir para as ruas a fim de ficar mais perto das pessoas. Há muita gente sofrendo com a desagregação familiar, as drogas, desespero e outros problemas”, conta o pastor Edmilson, psicólogo, formado em filosofia e ex-vereador. 

Entre as iniciativas, foram criadas a Marcha para Jesus e a noite gospel, que ocorrerá em 30 de maio, e costuma reunir entre 12 mil e 15 mil pessoas. O pastor explica ainda que, no Bairro Brasília, havia grande número de terreiros de candomblé e que 70% dos adeptos migraram para as igrejas evangélicas.

O presidente do Copales diz que não há clima de animosidade com os católicos e diz que a religião se propaga em todas as camadas sociais. 

“Temos advogados, juízes, não há mais esse tipo de preconceito. O importante é a pessoa se sentir bem e estruturar a sua vida”, afirma, explicando ainda que uma das maiores façanhas foi unir todas as igrejas evangélicas do município. 

“Fortalecemos o evangelho e convivemos com as diferenças. A placa na porta com o nome da igreja não vale tanto quanto o respeito que existe entre nós.” O pastor Mário Pacito, da Igreja Batista Nacional Filadélfia, no Bairro São Pedro, uma das primeiras a se instalar no município, diz que a meta é avançar. 

“O início aqui foi difícil, mas queremos chegar a 100% da população, sem querer provocar ninguém”, afirma, sem medo de exagerar. Entre as atividades realizadas além dos cultos, os batistas mantém as reunião das células, quando equipes vão às casas para “ensinar a palavra” ou simplesmente ser reunir com as famílias. 

Casados há 19 anos e pais de dois filhos, Jeferson Guimarães Rezende, de 41 anos, engenheiro, e Elionete Maria Regina Souza Rezende, de 37, fisioterapeuta, dizem que conhecer “a verdade, a palavra de Deus” é fundamental. “Sou evangélica há muito mais tempo do que meu marido e, desde, que nossos comportamentos se alinharam, a casa ficou mais harmoniosa”, afirma Elionete. “A crise no mundo vem a falta de família, de acolhimento para as crianças”, acredita Jeferson.

Em Belo Horizonte, a também batista Templo Getsêmani, no Bairro Dona Clara, na Região da Pampulha, reflete a disseminação da fé evangélica entre todos os segmentos da população e a participação das famílias nas celebrações. 

A igreja atrai milhares de pessoas em cultos bem movimentados, como o da última quinta-feira, que contou com a presença de jogadores de futebol, como o meia atacante do Cruzeiro Willian Siqueira. Ele compareceu acompanhado da mulher, Loisy, mãe das duas meninas do casal, uma de 2 anos e outra de apenas 10 meses. “A misericórdia de Deus é que nos fortalece a ser uma pessoa pura, com bom caráter e único foco em Jesus”, afirma o atleta, convertido em 2011.

Nova Lima: tradição e renovação

Sentada, sozinha, em um banco da Matriz de Nossa Senhora do Pilar, em Nova Lima, na Região Metropolitana de BH, a servidora pública Áurea Serretti Amaral, casada e mãe de um filho, alimenta a fé em Deus. 

“Não vou à missa todos os domingos, mas rezo o terço em casa diariamente. Acho que todas as religiões são para o bem, só peço que as outras pessoas respeitem a minha, assim como respeito as demais”, afirma Áurea. 

Entre os municípios da Grande BH, Nova Lima foi dos que menos perderam católicos neste século. Conforme o mapeamento feito pelo Centro de Processamento de Informação e Pesquisas Pastorais e Religiosas (Cegipar) da PUC Minas, com base nos dados do Censo 2010 do IBGE, foram cinco pontos percentuais, caindo de 75,6% em 2000 para 70,6% em 2010.

No altar, o titular da Paróquia de Nossa Senhora do Pilar, padre Célio Domingos Xavier, conta que Nova Lima tem a fé católica como tradição, e não como conservadorismo: “A tradição, que se mantém com os ritos e ritmos da vida das famílias e da comunidade, faz parte da alma do homem, enquanto o conservadorismo deteriora a tradição”.

Padre Célio ressalta que muitas igrejas protestantes não mantêm a tradição, estando mais preocupadas com o “imediatismo religioso, o momento de agora”. “O mundo vive tempos de crise econômica, política, social e de valores morais. Os fundamentalistas focam na prosperidade e até a Igreja Católica pode cair nisso. O papa Francisco abriu janelas que estavam fechadas, incomodou muitos e acordou milhares. Pena que alguns continuem no sono”, define.

Passado e Futuro

Diferentemente de Sarzedo, onde quase metade da população é evangélica, quem visita a cidade com o maior percentual de católicos em Minas dificilmente vê um templo da chamada religião protestante. Segundo os moradores de Camacho, onde 97,3% da população se declara católica, os pastores chegam de fora, procuram se estabelecer, mas batem em retirada em pouco tempo, por falta de fiéis. 

A Câmara, composta de nove vereadores, também não tem protestantes, conta o prefeito Geraldo Cardoso Lamounier, em seu quarto mandato, lembrando que o município se emancipou em 1952 de Itapecerica, cidade famosa pela religiosidade e celeiro de padres e bispos. 

“Sou católico praticante, fui coroinha e tesoureiro da igreja. Padre Alberto era muito conservador, não gostava de bailes nos fins de semana. Tive que me casar em Itapecerica, para poder fazer a festa depois da cerimônia”, recorda-se o prefeito, citando o sacerdote Alberto Evangelista Marques Guimarães (1901-1979), apontado como um dos pilares da religiosidade dos moradores.

Os mais jovens preservam o hábito de ir à missa, participar dos ritos e rezar com devoção. O casal de namorados William Johnnatan Furtado Silva, de 16, e Camila Cristina do Nascimento, de 17, está sempre nas celebrações conduzidas pelo padre Gedler Henrique Breves Pereira. “Ele fala a verdade e comenta sobre assuntos do dia a dia, sabe nos aconselhar muito bem”, diz a jovem. A coordenadora do Apostolado da Oração, Gláucia Maria Lopes comunga da mesma opinião e tem uma explicação bem particular para tamanha religiosidade em Camacho. 

“Acho que tudo começa pelos olhos de nossa mãe, Nossa Senhora das Dores”, afirma Gláucia, olhando para a imagem, que, durante a Quaresma, é retirada do altar junto com as outras peças sacras e levada para um cômodo, não ficando coberta pelo pano roxo, como ocorre em outras cidades.





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