Mudança de posição britânica em relação aos muçulmanos é preocupante - Por John Vinocur


Em Londres (Inglaterra) Quando é perguntado a Maajid Nawaz que mensagem os muçulmanos do Reino Unido encontram na proclamação pelo primeiro-ministro David Cameron de fracasso do multiculturalismo aqui, a resposta não é positiva.


Nawaz é um cientista político britânico de origem paquistanesa e um ex-islamita que fundou um centro de estudos antiextremismo chamado Quilliam. Sua resposta vem com a autoridade de um homem que mudou suas posições em relação ao Islã como imperativo político/religioso durante os quatro anos em que passou em uma prisão egípcia e que foi consultor na preparação da declaração de Cameron. Nawaz diz: “Os islamitas estão dizendo a todos que o que Cameron quer dizer é ‘mude sua religião’. É isto o que os muçulmanos estão ouvindo dos porteiros de suas comunidades.”

 
Esse é um ponto de vista que sugere que os islamitas britânicos pressionarão para que o governo seja realmente ignorado caso queira desmontar o status quo multicultural que Cameron diz que “encorajou diferentes culturas a viverem vidas separadas” e “tolerou essas comunidades segregadas se comportando de formas que contrariam totalmente nossos valores”.

 
O discurso do primeiro-ministro em 5 de fevereiro o deixou alinhado com os anúncios de fim do multiculturalismo feitos pela chanceler alemã Angela Merkel e pelo presidente francês Nicolas Sarkozy o que, aparentemente, significa que a acomodação das particularidades dos imigrantes muçulmanos devem acabar, substituídas por sua aceitação da primazia das leis, padrões e identidade cultural (mas não religiosa) da maioria do país anfitrião.

 
De fato, Cameron, com um olho voltado para seu eleitorado da mesma forma que seus pares francês e alemão, disse que quando “pontos de vista ou práticas inaceitáveis vêm de alguém que não é branco, nós somos cautelosos demais, até mesmo temerosos demais, de enfrentá-los”.

 
Mas a situação britânica, em seu contexto europeu, tem sido diferente ao longo dos anos e permanece a mais volátil. Às vezes obstinada, a segregação de suas comunidades imigrantes parece única; o nível de extremismo islâmico é amplamente considerado maior; e a defesa do excepcionalismo muçulmano (como o uso da Sharia) é mais popular, defendida por organizações como o Conselho Muçulmano do Reino Unido.

 
Os relatos de tensão e atrito entre as duas culturas podem ser espantosos.

 
Um artigo de jornal conta sobre uma professora de uma escola primária urbana que borrifou crianças bengalesas de perfumador de ar porque ela disse que elas fediam a curry. Outro relata sobre a fúria de um juiz, lorde Carlile, ao se aposentar após 10 anos como supervisor da estratégia de contraterrorismo do governo, que declarou os presidentes de universidades como sendo “fracos” e relutantes em lidar com os extremistas islâmicos nos campi. Segundo uma pesquisa Ipsos MORI, 70% dos jovens no final da adolescência e ao se tornarem jovens adultos, geralmente considerado o segmento mais flexível da população, consideram a imigração como sendo um problema.

 
Em um ponto de vista do continente europeu, o sociólogo holandês Paul Scheffer, autor de um novo livro, “Immigrant Nations”, descreve o Reino Unido como sendo um país, ao lado do Canadá, onde o multiculturalismo é mais entranhado, mas onde “a radicalização é mais intensa”.

 
E com um pessimismo irônico, Olivier Roy, o especialista francês em Oriente Médio, ao encontrar uma “geração pós-radical islâmica” nas revoltas no Egito e na Tunísia, escreve que os jihadistas internacionais mais radicais do Islamismo agora estão em outros lugares: no deserto norte-africano com a Al Qaeda, no Paquistão “ou nos subúrbios de Londres”.

 
Para falar sobre como o multiculturalismo britânico pode ser modificado, eu fui até a cidade de Rotherham, em Yorkshire, onde pessoas de origem paquistanesa representam até 10% dos distritos eleitorais parlamentares.

 
Mahroof Husain, o conselheiro do distrito encarregado da “coesão da comunidade”, não se esquiva do problema. Em uma tentativa de lidar com a alienação dos moradores brancos de classe operária e sua sensação de estarem em desvantagem em relação aos serviços sociais concedidos aos imigrantes, ele me falou em destinar a eles fundos destinados originalmente para prevenir a radicalização muçulmana.

 
Ao mesmo tempo, ele reconheceu que “grande parte da comunidade muçulmana está apreensiva em confrontar os radicais. Há uma questão de identidade não resolvida”.

 
Para uma explicação disto, eu conversei com o dr. Mohammed Hamid Husain, imigrante, médico, notável de Rotherham e membro da Ordem do Império Britânico. Não é possível ser mais britânico. Mesmo assim, ele disse: “Eu quero diferenciar entre integração e assimilação. Eu sou totalmente favorável à integração. Assimilação significa abrir mão de tudo.”

 
Denis MacShane, um membro trabalhista do Parlamento que representa muitos dos muçulmanos de Rotherham, disse que questões de confusão de identidade entre alguns de seus eleitores significam uma mentalidade que ele chamou de “semigração”.

 
De qualquer forma, a solução declarada por Cameron para a suposta falta de fidelidade e compatibilidade dos imigrantes “é um liberalismo muito mais ativo, vigoroso” (a definição cabe ao leitor), o que, em termos práticos, pareceu mais limitado do que ele definiu como sendo uma gestão “teórica” do dinheiro público, dado a organizações que “fazem pouco para combater o extremismo”.

 
Como Sarkozy e Merkel em suas declarações de morte do multiculturalismo, não contestadas aqui, o primeiro-ministro não ofereceu nada de tamanho e impacto suficiente para preencher seu espaço especulativo e lidar com a escala do problema da imigração muçulmana. Um programa inovador e ousado de ação afirmativa, repleto de empregos em troca de um regime de tolerância zero no combate de todas as manifestações de sociedades paralelas?

 
Não agora, não aqui, sem nenhuma chance.

Fonte: http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/herald

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