Secretário-geral do Conselho dos Imãs: ‘Os jovens das mesquitas não cometem atentados’



Dhaou Meskine, secretário-geral e porta-voz do Conselho dos Imãs da França, que reúne 457 religiosos, alerta: expulsar imãs, transformá-los em bode expiatório e fechar mesquitas vai “inflamar os bairros e gerar ódio”. 

Personagem influente no islamismo, o imã conduz as orações, mas sua função pode variar de acordo com seitas, regiões e mesquitas. Meskine é tunisiano e fundou a primeira escola privada islâmica da França. Foi preso (e inocentado) numa investigação sobre financiamento de terrorismo.

Como o senhor reagiu a este atentado?

É repugnante. Nossa tristeza é dupla, não é como a de todo mundo. Primeiro, porque não queremos que o país seja atingido desta forma. Segundo, porque sabemos que isso vai se voltar contra nós. Na ausência de um projeto econômico autêntico, alguns políticos, nem todos, vão se aproveitar da situação para ganhar eleitorado, apostando no nacionalismo, no racismo e no tema da segurança.

A extrema-direita pode chegar ao poder com um discurso anti-imigração?

Vai depender da atitude dos franceses. Depois dos atentados contra o “Charlie Hebdo", esperamos uma onda de racismo contra os muçulmanos, mas a mídia e os políticos jogaram o jogo para não fazer essa confusão. Agora, se não fizermos nada, o pior pode acontecer.

O que achou do discurso do presidente François Hollande ao Congresso?

Um presidente da República responde à expectativa da população. Ele tem a obrigação de tomar as medidas necessárias para salvar o país. Mas é preciso trabalhar essa questão nas suas várias dimensões. O extremismo pode acontecer em todas as religiões. Os jovens que estão nas mesquitas, igrejas e sinagogas não são os extremistas. Cada vez que acontece algo, começam a falar do discurso dos imãs, de sua formação, das mesquitas.

O primeiro-ministro Manuel Valls promete acelerar a expulsão de imãs radicais.

Por que não tratam os imãs como todas as outras profissões? Há uma Justiça neste país! Se ela decidir que tem que ser expulso, que seja. Nos últimos dez anos, cerca de 40 imãs foram expulsos. Fui consultado duas vezes e, nesses casos, os religiosos permaneceram na França. O discurso do primeiro-ministro segue a mídia, como se tivessem que achar o mal. Dizer que o fechamento das mesquitas vai resolver o problema é falso!

Para o senhor, é um erro, então, expulsar imãs?

Um país como a França tem que confiar na sua Justiça. Aqui, os imãs não são tratados da mesma forma que os outros. Para questões de judeus e cristãos, o Estado fala com rabinos e padres. Nas questões de muçulmanos, os imãs são expulsos e não têm direito à palavra. Queremos que sejam tratados como seus equivalentes em outras religiões.

Por que é diferente?

São associações como o Conselho Francês do Culto Muçulmano (CFCM), que não têm nada a ver com a religião, que falam por nós oficialmente. Não temos a mesma visão, somos opositores. Tive que entrar na Justiça para anular as eleições do CFCM em 2003. Na ocasião, fui recebido por Nicolas Sarkozy, então Ministro do Interior. Ele prometeu fazer algo pelos imãs, caso eu anulasse o processo na Justiça. Anulei, mas nada foi feito por nós, continuamos marginalizados. Em março de 2003, Sarkozy veio à assembleia geral dos imãs e reconheceu nosso papel. Os imãs podem ser interlocutores, mas na condição de que sejam independentes.

Para muitos, os imãs têm que fazer mais para evitar que jovens caiam no radicalismo islâmico.

Os jovens das mesquitas não cometem atentados. São os que aprenderam a religião pelas redes sociais ou outros meios. Eles não foram enquadrados pela sociedade, nem pelas instâncias públicas ou associações de bairros. Essas pessoas conheceram organizações como DDASS (uma versão francesa da brasileira Febem), fracassaram na escola pública, passaram pela prisão. Não temos influência sobre quem não vem à mesquita. Bernard Cazeneuve, atual ministro do Interior, é respeitável, mas a proposta de fechar as mesquitas não é solução. Isso vai inflamar os bairros, gerar muito ódio.

A França caminha para segregar os muçulmanos?

Espero que não. Mas se as verdadeiras soluções não são tomadas, se continuarem no caminho adotado nos últimos 16 anos para tratar do problema do Islã, eu temo o pior. Se começarem a perseguir muçulmanos porque são muçulmanos, será a guerra civil. Há um verdadeiro mal-estar na comunidade muçulmana.






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