RJ tem o 2º maior número de casos de intolerância religiosa do país – Por Káthia Mello

No primeiro semestre foram registrados 21 denúncias; em 2013, foram 39. Levantamento é da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência.

No primeiro semestre de 2014, o serviço do Disque Direitos Humanos (Disque 100), da   Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH), registrou 21 denúncias de ofensas à religião no estado do Rio de Janeiro. 

Mais da metade das ligações de todo o ano passado, com total de 39 denúncias no estado.

Somente esta semana, o assunto voltou a ser debatido na cidade duas vezes, com acusações envolvendo o tema. Na terça-feira (2), um aluno de uma escola da rede pública no Grajaú, Zona Norte, teria sido vítima de discriminação religiosa por estar usando guias de Candomblé sob o uniforme. 

Ele foi impedido de entrar na escola pela direção da instituição.  Na quarta-feira (3) um delegado da Polícia Civil atirou em um fiel da Igreja Geração Jesus Cristo, após uma audiência, no V Juizado Especial Cível, em Copacabana, Zona Sul. 

O policial, responsável pelo Núcleo de Combate à Intolerância Religiosa, move ação contra o pastor Tupirani da Hora Lores e membros da igreja, por perseguição nas redes sociais.

O serviço  Disque 100 da Secretaria de Direitos Humanos começou a funcionar em 2011, quando registrou um total de 3 denúncias no Estado do Rio de Janeiro. 

De acordo com os dados, no ano seguinte, o número saltou para 18 casos. O Rio de Janeiro está atrás apenas de São Paulo, que registrou neste primeiro semestre 22 casos. No ano passado, São Paulo teve um total de 50 denúncias e o Rio de Janeiro representou 16,8% do total das 231 denúncias do país.

De acordo com secretaria, uma pessoa pode ligar e fazer mais de uma denúncia. As ligações gratuitas podem ser feitas de qualquer lugar do país, a partir de telefone fixo ou celular, com a garantia do anonimato. 

Segundo a Secretaria, as denúncias recebidas são encaminhadas em até 24 horas às autoridades locais competentes. O balanço final de 2014 será divulgado no início do ano que vem.

Em entrevista ao G1, o Coordenador de Direitos Humanos do Ministério Público do Rio de Janeiro, procurador Márcio Mothé, disse que acompanha com preocupação o aumento de casos de intolerância religiosa no estado. 

"Estamos atentos e unificando os casos para estudar as providências a serem tomadas", explicou.

Mothé defende a ampliação da investigação das denúncias. "Já passou da hora de criar uma delegacia especializada para cuidar desses assuntos e investigar os envolvimentos", disse.

O procurador relatou que eles receberam informações de registros recentes de ocorrências na Ilha do Governador e em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. 

O MP têm sido procurado por diversas organizações de combate à intolerância religiosa. Entre as denúncias, estão ataques contra terreiros de Candomblé. 

Segundo ele, um dos encontros ocorreu em julho. O procurador-geral de Justiça, Marfan Martins Vieira, recebeu a superintendente de Promoção da Igualdade Racial do Município de Belford Roxo, Maria da Conceição Cotta Baptista. 

O encontro tratou dos recorrentes atentados a um terreiro de candomblé da mãe de santo, localizado em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, desde 2006. De acordo com Mothé, o promotor de Justiça Rogério Lima Sá Ferreira, acompanha as investigações desses atentados.

Após a divulgação do caso do menino impedido de entrar na Escola Municipal Francisco Campos por usar guias de Candomblé, o procurador enviou à Central de Inquéritos cópias das reportagens publicadas nos jornais. Segundo ele, a Promotoria de Justiça deverá analisar a conduta da direção da escola. 

De acordo com Mothé, a atitude da direção configura crime de discriminação previsto na Lei 7.716/89. A diretora também deve ser investigada por possível constrangimento ao menino, crime previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O procurador encaminhou ainda um ofício pedindo esclarecimentos sobre o ocorrido. No documento, Mothé ressalta que a Constituição da República preceitua que é inviolável a liberdade de consciência e de crença. 

“Intolerância religiosa constitui violação ao Estado Democrático de Direito e não se coaduna com a finalidade de construção de uma sociedade livre, justa e solidária”, disse.

Pedido de indenização

O advogado da família do estudante disse que vai entrar com uma ação na Justiça contra a Prefeitura do Rio de Janeiro por intolerância religiosa, após um encontro com o prefeito Eduardo Paes. 

O prefeito pediu desculpas à família e afirmou que a orientação para as escolas do município é que não haja impedimento para o uso de qualquer símbolo religioso, desde que seja respeitado o uniforme escolar.

A mãe do garoto, Rita de Cássia, disse que o filho, além de humilhado, foi vítima de discriminação religiosa. Mas os professores da escola negaram a versão da família. 

Segundo a professora de matemática Vânia Marques, o menino foi impedido de entrar na escola porque estaria descumprindo uma regra da própria Secretaria Municipal de Educação quanto ao uso do uniforme.

Os professores da escola se solidarizaram com a diretora e afirmaram em nota que em nenhum momento houve desrespeito ou discriminação religiosa. O menino foi transferido para outra escola no bairro onde, segundo a família, foi bem recebido e pode usar sem problemas as guias de Candomblé no pescoço.

Tiros na audiência

A advogada Luciana Pessoa, que defende o delegado Henrique Pessoa, da 79ª DP (Jurujuba), preso por atirar em um homem durante uma confusão na saída de uma audiência de conciliação no 5º Juizado Especial Cível, afirmou que o cliente agiu em legítima defesa. 

Segundo Luciana, o delegado teria disparado em direção ao chão e atingiu Carlos Gomes, 29 anos, integrante da igreja Geração Jesus Cristo, localizada no Santo Cristo, Zona Portuária.

A confusão ocorreu na saída da audiência por danos morais movida pelo delegado contra um integrante da igreja. Carlos Gomes, 29 anos, foi atingido no abdômen e recebeu alta na tarde desta quinta-feira (4). Ele contou que se viu no meio da confusão quando foi atingido pelo tiro. 

A advogada disse ao G1 que seu cliente vem sendo perseguido pelo pastor Tupirani e outros integrantes da igreja há pelo menos quatro anos. 

Segundo Luciana, o pastor foi investigado e preso em 2010, acusado de quebrar, junto com outro fiel da igreja, imagens religiosas de um Centro Espírita no Catete. 

"Desde então ele vem sendo atacado nas redes sociais e existem várias ações do delegado contra os integrantes dessa igreja", disse.

A advogada explicou que na audiência desta quarta não houve conciliação e na saída um grupo de 20 fiéis agrediu o delegado que revidou para se defender. No tumulto, o policial foi ferido na cabeça.

O pastor disse que também foi agredido, com uma cabeçada no nariz. Segundo ele, o delegado já moveu cerca de 10 ações judiciais contra ele e fiéis da igreja.


 Após a confusão, o delegado Henrique Pessoa foi levado para a 12ª delegacia, onde foi preso em flagrante. Na madrugada desta quinta (4), ele conseguiu liberdade provisória.



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