Intelectual muçulmana ensina sobre Holocausto - Por Samuel G. Freedman


Em meados de 2007, uma doutoranda chamada Mehnaz Afridi viajou da sua casa, na Califórnia, para uma conferência no sul da Alemanha. 


Oficialmente, sua tarefa era apresentar um estudo sobre o antissemitismo na literatura egípcia, um assunto bastante delicado em se tratando de uma intelectual muçulmana. Mas, a cerca de 100 km dali, ela tinha outro compromisso, com uma pauta ainda mais arriscada.

Ao final da conferência, Afridi viajou de carro até o antigo campo de concentração de Dachau, na Alemanha. De pé diante dos tijolos cinzentos do crematório, ela rezou. “Inna lillahi wa inna ilayhi raji’un”, disse em árabe. “Certamente pertencemos a Deus e a ele voltaremos”, é o significado da oração. 

“Eu não sabia que esse momento definiria meu papel”, disse Afridi, 44. “Nem percebi na ocasião que eu estava numa encruzilhada. As pessoas veem o Holocausto e o islã como duas coisas separadas, mas essas histórias de fé e de catástrofe não são opostas. Eles são companheiras.”

Afridi transformou esses aspectos irreconciliáveis em companheiros no trabalho da sua vida. 
Ela é professora-assistente de religião na Faculdade Manhattan, em Nova York. Foi criada no Paquistão, em Dubai, no Reino Unido e na Suíça antes de chegar aos Estados Unidos em 1984.

Afridi ministra cursos sobre o islã e o Holocausto e é diretora do Centro de Educação Inter-Religiosa, Holocausto e Genocídio da faculdade. Seu livro: “Shoah Through Muslim Eyes” (“O Holocausto pelos olhos muçulmanos”) será lançado em julho, e ela é membro do comitê de ética e religião do Museu Memorial do Holocausto dos EUA. Esses papéis têm feito de Afridi uma intermediária valiosa e um alvo visível nas relações conturbadas entre muçulmanos e judeus.

Embora seja muçulmana praticante, Afridi é vista por críticos dessa religião como alguém desleal, por colocar seu trabalho acadêmico pelo menos em parte a serviço da narrativa de uma tragédia judaica, em vez da história de derrota e expropriação que os palestinos chamam de Nakba.

Além disso, ela estudou em Israel e expressou em seus escritos o seu apoio a uma solução com dois Estados para o conflito entre israelenses e palestinos. A persistência de Afridi passou por um teste depois que ela entrou para a Faculdade Manhattan, em 2011. Nos meses subsequentes, contou ela, alguns muçulmanos a chamaram de “amante judia”. 

Mais preocupante para ela são os rumores nos círculos muçulmanos de que seu trabalho acadêmico estaria sendo secretamente financiado por judeus. Nada, porém, a levou a se autocensurar em seu papel como intelectual pública, disse ela. “Deus nos manda falar a verdade.”

“Se um muçulmano me pergunta por que eu não estou ensinando sobre a Nakba, digo que já sabemos a respeito, e que precisamos é aprender sobre o Holocausto”, afirmou ela. “E se um judeu me diz que ‘os muçulmanos são nazistas’, eu digo: ‘Podemos almoçar?’. Essas são as pessoas que devemos envolver.”



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