Pesquisa analisa presença estrangeira na construção de São Paulo - Por Fábio de Castro


Ao longo de quatro anos, um grupo interdisciplinar de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) realizou um amplo estudo com o objetivo de compreender, a partir da presença estrangeira em São Paulo, os processos de transformação física, demográfica, econômica, social e cultural ocorridos na cidade a partir do século 19.
O Projeto Temático “São Paulo: os estrangeiros e a construção das cidades”, coordenado pela professora Ana Lucia Duarte Lanna, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, teve a participação de pesquisadores da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e do Museu Paulista da USP.
Segundo Lanna, as pesquisas procuram abordar a presença estrangeira na capital paulista a partir de sua diversidade de formas – imigrantes, viajantes, visitantes, residentes, nativos ou “eternos estrangeiros” – na heterogeneidade dos modos de viver, descrever e simbolizar o outro.
“Evitamos reduzir a multiplicidade de experiências que constitui o estrangeiro como categoria sociocultural à figura clássica do imigrante, que é normalmente associada à explicação dos processos de modernização das grandes cidades americanas”, disse Lanna à Agência FAPESP.
“Partimos da figura do estrangeiro, mais ampla, com maior heterogeneidade de inserções e experiências, para tentar compreender como a cidade se transforma a partir dessa multiplicidade de encontros possíveis”, disse.
O projeto considerou os estrangeiros também em relação ao universo do trabalho. Os temas de investigação foram articulados em duas linhas de pesquisa: “A transformação dos bairros centrais, a construção de territórios, redes e identidades” e “A transformação dos campos profissionais: práticas, redes, atores e circulação de saberes”.
“As pesquisas incluíram desde estudos sobre trabalhadores italianos, judeus e japoneses até a vinda de intelectuais, artistas, arquitetos e urbanistas. Essa ampla gama de tipos profissionais e nacionalidades, com inserções e tempos de permanência muito variados, permitiu problematizar melhor essa relação que é muito importante para a cidade de São Paulo”, disse Lanna.
As reflexões realizadas sobre os vários grupos de estrangeiros e os aspectos relacionados aos trabalhos foram associadas a outros recortes, abordando categorias como bairro, território e sociabilidade.
O projeto também teve a preocupação de salvaguardar parte dos acervos com os quais os pesquisadores trabalharam, que estavam sob a guarda da FAU e do Museu Paulista. Uma das principais propostas do projeto consistiu em elaborar um banco de dados que pudesse formar uma plataforma disponível para outros estudos futuros, com as mais variadas abordagens.
“Todo o material – incluindo projetos arquitetônicos e decorativos, plantas, fotografias e mais de mil mapas da cidade de São Paulo, das coleções de arquitetos e fotógrafos estrangeiros – foi tratado e selecionado. Boa parte foi digitalizado”, disse Lanna.
Para que a consulta do banco de dados fosse mais ágil, seu conteúdo foi adaptado e disponibilizado no site http://estrangeiros.fau.usp.br. “O banco de dados continuará sendo alimentado com outras informações ou pesquisas que surjam como desdobramento do Projeto Temático”, disse.
Sentido de ser estrangeiro
O banco de dados disponibiliza também referências a artigos escritos por estrangeiros ou que tratam da presença estrangeira no país, publicados na Revista de Cultura Anhembi, na Revista do Arquivo Municipal e na Revista Sociologia. Além de toda a documentação, várias das pesquisas realizadas no Projeto Temático utilizaram entrevistas.
O site apresenta também uma seção focada em bairros que congregam múltiplos personagens estrangeiros e foram os locais privilegiados de pesquisa. Os bairros do Bom Retiro e Bexiga são intensamente explorados.
“No Temático, nos preocupamos em tentar compreender a construção dos territórios da cidade mais marcados pela presença de estrangeiros. A análise dessas áreas nos permitiu compreender como a presença estrangeira contribuiu para a produção do espaço urbano paulistano”, afirmou Lanna.
Outro produto do Projeto Temático, além do banco de dados e do site, foi o livro São Paulo, os estrangeiros e a construção da(s) cidade(s), publicado pela editora Alameda, com apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Publicações.
Além de Lanna, participaram da organização da obra Fernanda Arêas Peixoto, professora do Departamento de Antropologia da FFLCH-USP, José Tavares Correia de Lira e Maria Ruth Amaral de Sampaio, ambos professores da FAU-USP.
A obra foi resultado de um dos seminários internacionais realizados no âmbito do projeto e teve a participação de todos os pesquisadores envolvidos com ele, além de vários autores convidados.
“O livro apresenta a discussão sobre São Paulo, mas não se restringe a ela, porque alguns dos convidados trabalhavam com a reflexão sobre a relação entre os estrangeiros e as cidades em outros contextos”, disse Lanna.
Um segundo livro, que deverá ser lançado ainda em julho, abordará a relação entre o estrangeiro e a cidade com foco na questão do deslocamento.
“Os estudos que serão apresentados nesse livro tiveram o objetivo de compreender o sentido de ser estrangeiro e, para isso, é importante avaliar como ele veio ao Brasil, como escolheu o país e a relação estabelecida entre o lugar de origem e o destino”, disse Lanna.
  • São Paulo, os estrangeiros e a construção das cidades


    Organizadores: 

    Ana Lucia Duarte Lanna, Fernanda Arêas Peixoto

    José Tavares Correia de Lira

    Maria Ruth Amaral de Sampaio. 

    Lançamento: 2012

    Mais informações: www.alamedaeditorial.com.br


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