Aos 105 anos, umbanda ainda enfrenta preconceitos – Por Natália Fernandjes

A comunidade umbandista comemora 105 anos da religião brasileira que cultua os Orixás hoje.

Apesar de ainda enfrentar o preconceito de grande parte da sociedade, inclusive de seguidores, a doutrina comemora o diálogo interreligioso e a disseminação de sua filosofia, que prevê a humildade, caridade e a harmonização das famílias.

Fundada em 15 de novembro de 1908 pelo médium Zélio de Moraes, no Rio de Janeiro, a religião ganhou força à medida que o catolicismo não atendia às necessidades da população, explica o presidente da Federação Umbandista do Grande ABC, Ronaldo Antônio Linares, ou apenas Pai Ronaldo. Sua estimativa é que a umbanda tenha cerca de 40 milhões de adeptos no Brasil e que cerca de 15% dos moradores da região sejam praticantes.

De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no entanto, apenas 0,33% da população do Grande ABC se declara seguidor da religião. “Muitos se declaram espíritas para fugir do preconceito, que quase sempre ocorre por desconhecimento ou fanatismo”, diz.

O cenário da umbanda atual mostra que muitos ‘filhos’ que abandonaram a religião em detrimento dos cultos evangélicos estão retornando, observa Pai Ronaldo. São pelo menos 400 terreiros espalhados pelas sete cidades, mas, segundo ele, cerca de 70% dos praticantes não conhecem sua filosofia. “Mistura-se muito com o candomblé (religião de influência africana) e esoterismo”, destaca.

O culto umbandista congrega elementos das culturas branca, negra e indígena. “Temos um altar católico, uma prática espírita e um ritual meio africano, meio indígena”, explica pai Ronaldo. 

Nos terreiros são realizadas as chamadas giras, onde os seguidores fazem suas preces, cantam, dançam e incorporam diversos guias.

O primeiro encontro da umbanda foi realizado em 16 de novembro, na Tenda Nossa Senhora da Piedade, no Rio de Janeiro, um dia após a primeira manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas no ainda jovem Zélio de Moraes, durante uma reunião da recém-formada Federação Espírita de Niterói. A partir de então, a religião se difundiu e surgiram diversos centros de umbanda.

“Ele (Caboclo das Sete Encruzilhadas) fez revelações sobre acontecimentos que estavam por vir, como duas ondas de sangue sobre a Europa e que um único engenho militar seria capaz de destruir milhares de pessoas”, afirma Pai Ronaldo ao explicar que as previsões se referiam às duas guerras mundiais e à explosão da bomba atômica no Japão.

Ao lembrar do episódio em que conheceu Zélio de Moraes, já idoso, a emoção tomou conta de Pai Ronaldo. “Ele me disse que eu era o homem que iria tornar conhecido o seu trabalho”, lembra. 

E assim o médium vem fazendo. Desde a fundação do Santuário Nacional da Umbanda, na Estrada do Montanhão, em Santo André, há quase 40 anos, até a luta para oficializar o dia 15 de novembro como o Dia Nacional da Umbanda.

Criado para que a comunidade umbandista tivesse um espaço para cumprir seu rito, o santuário é refúgio em área de 645 mil metros quadrados, sendo apenas 5% construída. 

“Quando chegamos aqui isso tudo era um espaço devastado após anos de exploração mineradora. Hoje temos uma área verde preservada”, orgulha-se Pai Ronaldo.

Crença é lembrada em atividades culturais

Além de ser lembrada em sessão solene, realizada pela Câmara de Ribeirão Pires, no dia 22, a umbanda integra calendário de atividades das prefeituras voltado ao Dia da Consciência Negra, celebrado na quarta-feira.

Ribeirão Pires organizou série de apresentações na data, como a do grupo Cultura Afro-Brasileira, comandado pelo Pai Wilson, que reunirá os povos de umbanda da cidade. Além disso, a população poderá assistir gratuitamente a diversos shows, que serão realizados a partir das 14h no palco da Vila do Doce, no Centro.

Em Diadema, o evento Kizomba, Festa da Raça, organizada pela Coordenadoria de Promoção de Políticas Públicas para a Igualdade Racial, terá atividades como uma celebração da Pastoral Afro da Paróquia Arnaldo Jansenn, no dia 23 de dezembro, às 19h, no Poliesportivo Eduardo de Jesus (Avenida Brasília, bairro Campanário). 

A celebração é uma missa que envolve diversas religiões. Já no dia 30 de novembro será realizada uma Roda de Conversa do Ponto de Cultura Êremi, Casa das Minas Thoya Jarina, no Centro Cultural Canhema (Rua 24 de Maio, 38), às 16h.

São Bernardo realizou sessão solene em comemoração à data na terça-feira e a 1ª Festa em Homenagem ao Dia Nacional da Umbanda ocorreu no domingo. Promovido pela AUEESSP (Associação Umbandista e Espiritualista do Estado de São Paulo), o evento atraiu milhares de seguidores da religião ao Ginásio Baetão.


“É uma data muito importante para a umbanda e a maior parte dos terreiros da região fará trabalhos voltados à memória de Zélio de Moraes”, destaca Pai Ronaldo. 




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